É inadmissível e inaceitável que, na democracia portuguesa, tenhamos um deputado como André Ventura e o seu partido, Chega, que, repetidamente, recorrem a discursos de ódio racial, principalmente nas redes sociais. Como cidadã cabo-verdiana e também com nacionalidade portuguesa, residente em Portugal, sinto uma profunda tristeza em saber que vivo num país onde há espaço para um discurso que alimenta o preconceito e a discriminação. Esse tipo de retórica, além de ser um crime contra os valores fundamentais da Constituição da República Portuguesa, representa uma ameaça grave à nossa democracia.
A Constituição portuguesa foi construída sobre os princípios da igualdade, da dignidade e do respeito a todos os cidadãos, sem distinção de raça, religião, ou origem. O que assistimos, no entanto, é a uma constante tentativa de dividir a sociedade, de semear a desconfiança entre os cidadãos e de perpetuar preconceitos históricos. O ódio não pode ser tolerado, muito menos quando se disfarça de liberdade de expressão. Porque o ódio, quando vem de uma figura pública eleita, não é apenas uma opinião – é uma agressão moral que afeta diretamente o dia a dia de muitos cidadãos que têm Portugal como sua casa e se veem constantemente desrespeitados e atacados.
Portugal é um país que, historicamente, acolheu povos e culturas diversas, enriquecendo-se com essa diversidade. Eu, como cabo-verdiana e portuguesa, vivo esse valor diariamente. Porém, quando vejo um deputado a desrespeitar a minha identidade e a dos meus semelhantes, sou lembrada de que ainda há um caminho a ser percorrido para que todos os cidadãos sejam verdadeiramente aceites e valorizados, não apenas na teoria, mas na prática.
A democracia que defendemos precisa ser um ambiente onde todos se sintam seguros, onde a diversidade seja respeitada, e onde o discurso de ódio seja veementemente repudiado.
Como cidadãos, é nosso dever não nos calarmos perante a promoção do ódio. Precisamos deixar claro que Portugal deve caminhar rumo à inclusão, ao respeito e à justiça para todos. Não podemos permitir que discursos irresponsáveis e desumanos sejam normalizados, nem que figuras públicas eleitas perpetuem a divisão entre portugueses. A voz da igualdade e da união deve sempre prevalecer.
A sua postura enquanto membro de um Parlamento que representa o seu povo não é de defesa de valores nacionais, mas sim de demonstração de ignorância e falta de humanidade, e pergunto, como é possível a democracia portuguesa dar lugar a um deputado que deixa claro o seu posicionamento racista e xenófobo e é aplaudido por outros deputados na Assembleia da República?
Neste contexto, também peço que as autoridades cabo-verdianas intervenham de forma firme e clara. O combate ao racismo e ao ódio é uma causa que ultrapassa fronteiras e exige solidariedade entre nações que se comprometem com os valores democráticos. Cabo Verde e Portugal têm uma ligação histórica e cultural profunda e o respeito entre os seus povos deve ser defendido. Que as autoridades cabo-verdianas reforcem, ao lado de Portugal, a importância de uma democracia inclusiva, onde o ódio e a discriminação não encontram espaço.
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