Poderíamos imaginá-los sentados à mesa, talvez com uma garrafa por perto, um pão fumegante, outras suculências provindas de terras próximas, alimentos cultivados por mãos benfazejas. Pequenas coisas que podem tornar a vida melhor, para laçar o subtítulo Uma Ideia de Felicidade, livro que é também uma conversa entre amigos, que aqui partilham experiências, histórias, biografias. Sejam estas as de Carlo Petrini, jornalista italiano que fundou o movimento internacional Slow Food, como reação a uma industrialização da alimentação e outras perdas trazidas pela voragem da contemporaneidade; sejam as militâncias literárias, políticas e cívicas do escritor chileno Luis Sepúlveda, autor de vários best sellers. A felicidade é coisa ideológica, também.
O diálogo começa pela procura de um conceito comum a lentidão antes de abrir para o jogo de simetria seguinte, em que há sete ou oito capítulos para cada um dos autores explorar à vontade, subordinados a temas tão genéricos, universalistas e filosóficos como “Uma ideia de partilha”, “Uma ideia de alimentação”, “Uma ideia de natureza” ou “Uma ideia de política”. A partir do último romance do chileno, História de um Caracol que Descobriu a Importância da Lentidão, Petrini aborda o “direito ao prazer”, mote para que Sepúlveda se lance numa reflexão sobre a ação recente da esquerda, a escravidão, parrillas, Jean Giono, florestas, Salvador Allende, o ato “sacramental” (nas palavras do chileno) de comer pão, a doença dos padeiros, a poesia, tudo em menos de duas garfadas. Lá para o fim das páginas, a militância fá-lo-á abordar a questão da cultura dos salmões de viveiro, que, através dos antibióticos, corantes e hormonas ministrados, “matam o mar”. Aqui, surge a consciência da gastronomia como algo intrinsecamente humano, gerador de felicidade, que não se separa nunca da ética, da ecologia, da liberdade. Da solidariedade.
UMA IDEIA DE FELICIDADE
DE LUIS SEPÚLVEDA E CARLO PETRINI
Porto Editora
120 págs., €14,40