Quem vê Peter rodeado de crianças que mal lhe dão pela cintura, e se apressa a tirar conclusões, vai acertar ao lado. O ritmo do funaná no toca-discos a aquecer aquela manhã subitamente fria pode dar pistas, mas não chega. Será preciso começar a cheirar à sopa do almoço na creche A Árvore para o rapaz de bata demasiado pequena contar um pouco da sua vida.
A vida de Peter, contada a estranhos, sai-lhe num português arrastado e lento como uma morna. Há uns anos, teria sido preciso um intérprete – da sua boca só saía crioulo, fosse por preguiça fosse por teimosia. Godelieve Meersschaert, fundadora da Associação Cultural Moinho da Juventude, na Cova da Moura, bairro da Amadora, apresentara-o como um “caso de sucesso extremo”. Bastariam uns minutos para percebermos que Lieve não exagerou.
Até há pouco tempo, era em crioulo que Peter recebia a visita inoportuna da polícia. Se havia confusão, os agentes da PSP chegavam “e nem procuravam saber o que se passava”, levavam tudo para a esquadra, houvesse espaço na carrinha. Quem o via metido em sarilhos temia-lhe o futuro. Filho de cabo-verdianos da ilha de Santiago, ele pedreiro e ela doméstica, ambos a morar em Portugal desde o final dos anos 1970, Peter não passara do 6.° ano de escolaridade e tardava em assentar. Sabia as artes de pedreiro, eletricista, carpinteiro, mas ouvia sempre um “não” no Centro de Emprego. “O nome do bairro também contribuía…”
A sua tábua de salvação foi o curso de peritos de experiência, no âmbito de um projeto financiado pela União Europeia, chamado Missing Links.
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