Uma reunião de condomínio da Trump Tower, em Manhattan, promete ser mais animada do que qualquer outra. Mesmo assim, os recém-casados Kellyanne e George Conway estavam longe de imaginar o impacto que aquela discussão com os seus vizinhos iria ter na sua vida conjugal. Corria o ano de 2001 e o tema na agenda era a retirada, ou não, do nome Trump da fachada do prédio. George, um experiente advogado que se tornara famoso por ter trabalhado as bases de um possível impeachment de Bill Clinton, defendeu eloquentemente a continuidade da placa no vistoso edifício – o que muito agradou ao promotor imobiliário e àquele que viria a ocupar o lugar de Presidente dos Estados Unidos da América. Como agradecimento, ofereceram-lhe um lugar no conselho de administração do condomínio. George, que por uma questão de “preguiça” não estava para aí virado, acabou por falar nisso em casa e a mulher, Kellyanne, não hesitou e aceitou.
Foi o princípio de uma bela amizade, que atingiu o auge 15 anos mais tarde, quando Kellyanne se juntou à equipa de Trump e se tornou a primeira mulher a realizar uma campanha presidencial de sucesso. George, que sempre motivou a mulher a perseguir os seus sonhos e a ser independente, recebeu a notícia com satisfação, mas também com apreensão. “Eu sabia que as nossas vidas nunca mais seriam as mesmas”, confessou recentemente. Quando Donald Trump faz o seu primeiro rascunho do discurso de uma vitória iminente, George encheu-se de orgulho pelo “papel histórico” que a sua mulher teve como diretora de campanha. Chorou de alegria: “Ela fez isto! Ela fez História!”
Porém, nos dois últimos anos, a imagem do casal americano de sucesso da era Trump está a aparecer cada vez mais turva. Kellyanne, 51 anos, continua a ser a conselheira da Casa Branca, o “cão de guarda” mais feroz do Presidente, que se mantém fiel contra tudo e todos, arranjando sempre argumentos para defender declarações e decisões de um Chefe de Estado tantas vezes inconstante. Só que George, 54 anos, tem gostado cada vez menos do retrato geral e não se tem inibido de o proclamar publicamente, usando a arma preferida de Trump: o Twitter.
Ironias e ciúme
Para George, o momento de viragem face ao Presidente foi quando este demitiu o diretor do FBI, James Comey, na altura em que a investigação sobre a interferência da Rússia nas eleições ganhou força. George, que acabou por secundarizar a sua carreira no seu próprio escritório de advogados, em Nova Iorque, e integrou um outro quando se mudou com a mulher para Washington DC, até teve hipótese de ser nomeado para um cargo no departamento de Justiça da Administração Trump. No entanto, o caso Comey levou-o a retirar-se da corrida, prevendo que estaria em permanente conflito com a presidência.
Assim sendo, ficou livre para bombardear com tweets várias ações de Trump, defender a investigação do procurador Robert Mueller e considerar “falsas e enganosas” algumas declarações do Presidente, para gáudio de democratas e de muitos republicanos igualmente insatisfeitos. Por ser marido da maior defensora do “trumpismo”, George é visto como o maior símbolo atual da resistência e os seus tweets ou retweets tornaram-se virais. No início de março, assumiu-se como um homem sem partido, mudou o seu estado de republicano para “não afiliado” e a sua presença num grupo de céticos denominado Encontro dos Preocupados, que gostariam de ver Trump – e, por inerência, Kellyanne – apeados da Casa Branca, foi lenha para a fogueira.
Não tardou muito até que jornalistas, analistas e a fina flor da sociedade norte-americana se interrogassem até onde isto poderia continuar. Até quando vai a vida de casal aguentar e, sobretudo, até onde estará Trump disposto a deixar que a situação chegue? Qual a ponta do triângulo que vai rebentar? Há mesmo quem aponte a situação vivida pelo casal Conway como a melhor metáfora da América, sendo o mal-estar sentido entre o casal similar à divisão que os norte-americanos, e particularmente os republicanos, sentem entre si face ao seu Presidente.
O drama doméstico do casal espalhou-se e intensificou-se muito mais depois de uma longa reportagem publicada a 15 de agosto pelo Washington Post. Kellyanne convidou o repórter Ben Terris para passar uns dias na sua casa de 15 mil metros quadrados (que comprou por quase sete milhões de euros) e testemunhar como a vida de casal continuava harmoniosa, com os seus quatro filhos (Claudia e George Jr., gémeos de 13 anos, Charlotte, de 10, e Vanessa, de 8) e dois cães corgi (Skipper e Bonnie).
Acontece que o repórter consegue confissões deliciosas. Desde logo, George diz que está arrependido de ter falado a Kellyanne sobre o convite para integrar o conselho do condomínio, pois, não fosse isso, ela nunca teria conhecido Trump. E, ao lembrar a foto em que chorou de alegria quando a vitória era certa, deixa escapar: “Agora choro por outras razões.” A reportagem torna claro que, para George, é cada vez mais confrangedor ver a mulher assumir aquele papel, mostrando-se “entristecido com a forma como as coisas acabaram” e cético em relação ao entusiasmo que Kellyanne continua a mostrar pelo “seu chefe”. E quando esta expressão é rapidamente corrigida por ela – “Ele não é apenas meu chefe. Ele é o nosso Presidente” –, George vira costas enquanto responde: “Sim. Vamos ver quanto tempo vai durar.”
Kellyanne, porém, interpreta a atitude acossada do marido como uma espécie de ciúme, já que ele acha que ela o trocou por Donald Trump. “O que é ridículo. Uma coisa é o meu trabalho, outra é o meu casamento”, vai dizendo. Porém, acaba por admitir que desconfia de que o próprio Trump, embora ainda não tenha tomado qualquer atitude contra ela, considera os tweets do marido “indelicados”. Mais: ela acha os tweets do marido “desrespeitosos” para consigo mesma. “É uma violação da decência básica, senão mesmo dos votos matrimoniais.” Ao que o marido responde: “O problema dela é com o chefe, não comigo.” Até quando estará seguro este casamento de 17 anos?