“É a primeira instância que junta os quatro quadrantes do Oceano Atlântico”, orgulha-se o ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, a propósito da apresentação do Atlantic Centre – uma organização que nasceu aberta ao mundo, daí o nome em inglês, e que, apesar de estar na dependência daquele ministério, deixa de fora qualquer menção militar. “O primeiro nome era CeDA – centro para a defesa do Atlântico -, mas deixámos cair a ideia de defesa porque remetia muito para uma linguagem militar e queremos ter uma perspetiva mais abrangente”, conta o ministro à VISÃO, a bordo do Falcon que o levaria à ilha Terceira, para a cerimónia oficial de lançamento.
Pouco depois de aterrar na ilha, o jornal Expresso revelava uma carta de seis páginas, crítica da reforma da estrutura superior das Forças Armadas e da crise que o setor atravessa, subscrita pelo “Grupo dos 28” ex-chefes militares dos três ramos, encabeçada pelo ex-Presidente da República general Ramalho Eanes. O diploma irá à Assembleia da República na próxima terça-feira, 18, sendo que o ministro não quis fazer comentários à polémica.
A ideia de criar um organismo que juntasse todos os países com interesse no Atlântico já vinha de trás, do seu antecessor, e nasceu da constatação de que era preciso dar uso às instalações e equipamentos deixados vagos com a redução substancial do contingente americano na Base das Lajes. “Tudo começou há quatro ou cinco anos com um raciocínio muito prático: há uma redução do número de efetivos na Base das Lajes e, portanto, alguma disponibilidade de edifícios e infra-estruturas”, diz João Gomes Cravinho. Fazia sentido tirar partido da posição geo-estratégicas dos Açores, que já terão sido determinantes para a adesão de Portugal à Nato. “Ganha-se consciência de que o Atlântico, ao contrário do que muitos imaginavam, e que levou a esta redução de efetivos na Base, voltou a ganhar centralidade estratégica”, sublinha. “Temos o degelo do Ártico, que cria uma nova rota de acesso, temos a presença russa na Crimeia e a rota de acesso por via do Mar Negro, a digitalização que nos faz depender cada vez mais de linhas de comunicação, uma maior consciência dos oceanos, o combate às alterações climáticas, os desafios à biodiversidade e uma nova disponibilidade dos países do Atlântico de começarem a trabalhar em conjunto.”
Três objetivos essenciais juntam os membros fundadores – Alemanha, Angola, Brasil, Cabo Verde, Espanha, EUA, França, Gâmbia, Portugal, Reino Unido, Senegal, São Tomé e Príncipe, Uruguai – que têm em comum o Atlântico: o diálogo político; a produção de conhecimento e a formação. “Temos países grandes, países pequenos. É uma excelente base!”
Termina hoje a primeira formação no âmbito do Atlantic Centre, dedicada à segurança marítima no Golfo da Guiné, uma região que como é sabido é especialmente sensível nesta matéria e que enfrenta problemas como a pirataria armada e raptos para efeitos de resgate, o que, de acordo com um relatório do Conselho da União Europeia, “compromete a boa governação dos oceanos, numa zona marítima de interesse.”
De boleia no Falcon, seguiu também o ministro dos Negócios Estrangeiros da Gâmbia, Mamadou Tangara, que após ter cumprido ontem a primeira visita oficial a Portugal de um chefe da diplomacia daquele país, se apresentará na cerimónia de lançamento do Atlantic Centre, alimentando o “namoro” entre os dois países.
“Há países da NATO que são membros da NATO e também do Atlantic Centre, mas esta não é uma instituição da NATO nem da União Europeia. É uma instituição dedicada sobretudo aos países do Norte/Sul/Este/Oeste e à manutenção da paz no Atlântico, o que inclui cuidar de questões relacionadas com o ambiente, alterações climáticas ou pesca ilegal”, sublinha João Gomes Cravinho. E Portugal entra nesta equação pela sua apregoada “facilidade de relacionamento”, dentro da Europa, África, América do sul e do norte. “Estamos particularmente bem posicionados.”