A atividade no mercado imobiliário português abrandou no 1º semestre de 2023. O alerta foi dado pela consultora JLL, realçando em relatório, que este registo “interrompe uma tendência de crescimento que vinha sendo verificada ao longo de 2022 que, recorde-se, assinalou novos recordes em praticamente todos os mercados ocupacionais”.
O atual contexto de acentuada subida das taxas de juro e a continuada escassez de oferta disponível para ocupação imediata, numa altura em que as pressões inflacionistas abrandaram, mas em que ainda se fazem sentir, são os principais fatores na base deste menor dinamismo, levando muitas empresas e investidores a colocar em suspenso decisões de investimento até perceberem como evoluirá a economia neste novo ciclo.
Nos primeiros seis meses do ano, não obstante o volume de transações em pipeline e o continuado interesse dos investidores no nosso país, o investimento imobiliário comercial atingiu 760 milhões de euros, numa queda homóloga de 8%. Mais de 60% deste volume foi transacionado no 2º trimestre e, em termos de origem do investimento, os estrangeiros continuaram a representar mais de 80% do investimento no semestre.
O imobiliário de hotelaria, juntamente com o de industrial & logística e o de retalho, registam os melhores desempenhos, prosseguindo em rota ascendente, como conclui ainda o mais recente Portugal Market Pulse, no qual a JLL analisa o comportamento do mercado imobiliário português no 2º trimestre.
“2023 marcou o arranque de um novo ciclo económico na Europa, e isso reflete-se no mercado imobiliário. Continua a haver muita liquidez e vontade de investir, e as pessoas e empresas não deixaram de crescer e de necessitar de ocupar imóveis, contudo, as condições mudaram e, por isso, estes últimos meses têm sido tempos de adaptação da procura aos ajustes no contexto macroeconómico”, referiu Pedro Lancastre, CEO da JLL Portugal, acrescentando que, ainda assim, a economia nacional continua a crescer, e a um ritmo superior ao estimado, sendo expectável que o mercado imobiliário também responda de forma alinhada nos longos dos próximos meses.
“Na área de investimento, que é um dos barómetros mais importantes da atividade do mercado, o redobrado dinamismo na passagem para o 2º trimestre confirma estas perspetivas mais otimistas para o restante do ano, ao longo do qual a dinâmica investidora deverá retomar gradualmente. Os nossos fatores de atração não se dissiparam e continuamos a ter um mercado muito sólido e competitivo a nível europeu”, sublinhou ainda.
1.000 novas camas em hotéis cinco estrelas
O turismo consolidou-se como um dos principais motores de crescimento económico, com forte atividade ocupacional e níveis a superar o pré-Covid. Os dados disponíveis até maio revelam subidas homólogas de 25% no número de turistas e de dormidas, e de 33% no número de passageiros desembarcados nos aeroportos. Estes resultados têm tido impacto no imobiliário hoteleiro, onde as diárias médias superam os valores de 2019, quer em Lisboa quer no Porto, embora a oferta continue a expandir-se a um ritmo moderado, com 1.089 camas de cinco estrelas inauguradas no país.
Ao longo dos cinco primeiros meses do ano desembarcaram mais de 10 milhões de passageiros nos aeroportos portugueses, num crescimento anual de 33% e 13% face ao pré-pandemia (2019). Mais de 80% das chegadas foram provenientes de voos internacionais, sendo de destacar o número de turistas oriundos dos Estados Unidos da América.
Mais Habitação assusta promotores
Entretanto, quer na modalidade de compra e venda quer no arrendamento, o acesso à habitação continua sob pressão no mercado português. Com a procura a exceder largamente a oferta disponível e as taxas de juro a limitarem o acesso de muitas famílias à compra de habitação, o número de vendas abrandou ao longo do semestre, ao mesmo tempo que é evidente um crescimento substancial da procura por arrendamento. Neste contexto, tanto em Lisboa como no Porto os preços de venda mantêm-se estabilizados, enquanto as rendas sobem.
Em Lisboa, o mercado residencial mantém-se com preços médios de venda na ordem dos 4.470 €/m², valor que se mostra “estável” em termos homólogos. No Porto, os preços médios de venda exibiram uma tendência de correção, descendo 9% em termos anuais para 3.150€.
Valores ainda elevados para a classe média portuguesa e que o programa Mais Habitação não vai alterar, vaticina a JLL, sublinhando que a medida governamental só veio gerar “grande incerteza entre os investidores, levando mesmo à suspensão de alguns projetos e temendo-se que possam vir a restringir ainda mais a promoção de projetos destinados ao arrendamento”.
Escritórios em queda, retalho em resiliência
Tendo como ponto de comparação aquele que foi o melhor ano de sempre para o setor, a atividade no mercado de escritórios “é uma das que mais abrandou no 1º semestre de 2023, com a ocupação a cair 77% em Lisboa e 17% no Porto, em termos homólogos”, aponta-se no comunicado. Além do contexto económico, este é um mercado onde a escassez de oferta moderna e com os níveis de qualidade atualmente exigidos no mundo corporativo disponível para ocupação imediata continua a ser um entrave à atividade, como sugere o facto de as rendas se manterem estabilizadas em ambos os mercados num cenário de perda de take-up (arrendamento).
A atividade no setor do retalho continua a mostrar a sua resiliência perante a mudança, evoluindo positivamente em praticamente todos os formatos, com os segmentos dos centros comerciais e do comércio de rua a liderarem em termos de subida de rendas. Com os operadores a prosseguirem os seus planos de expansão, é evidente uma reorganização no comércio de rua de Lisboa e Porto, onde os diferentes eixos concentram focos de comércio cada vez mais segmentados.
Entretanto, a ocupação praticamente que duplicou no mercado industrial e logístico, atingindo os 308.000 m² no 1º semestre. Contudo, a criação de nova oferta continua a ser uma necessidade premente neste mercado, no qual a procura não mostra sinais de abrandamento, sustentando assim o reforço do investimento no lançamento de novos projetos de promoção, contabilizando-se atualmente mais de 700.000 m² em construção.
“Os resultados do Market Pulse do 2º trimestre vêm confirmar as projeções que tínhamos traçado no início do ano, colocando em evidência a solidez do mercado imobiliário português. Apesar de um contexto financeiro e económico mais desafiante, e contra um período homólogo onde os níveis de atividade foram excecionais em praticamente todos os setores, o principal motivo para as quebras de atividade reportadas nos setores de escritórios e habitação prendem-se, sobretudo, com a falta de oferta para responder à procura e com a cautela dos consumidores e ocupantes face à evolução da economia e dos juros”, rematou Joana Fonseca, Head of Strategic Consultancy & Research da JLL.