A última crónica
Aprendi a escrever 3 000 caracteres intuitivamente. Sem ter de usar a opção “contagem de caracteres”. Aprendi a escrever de forma automática, sem pensar. Ou seria fácil ou seria impossível. Optei pela primeira via
Café Corcel
Lembro-me de que o Rui Veloso me contou que conheceu o Zé Nabo no Corcel, que acaso, que encontro tão importante, tão determinante para mim
O sucesso e o fracasso
Eu penso no sucesso e no fracasso como gémeos verdadeiros, idênticos, formados a partir do mesmo óvulo, gémeos que se confundem
Massarelos
Sinto especial comoção em olhar para as pedras do Cais das Pedras, o rio Douro, as pessoas, os cafés, os Ubers, os rabelos de passeio, as teias que vidram nas janelas e esperam um barco parecido com elas
A carteira
Essa carteira de couro preto, normal, vazia de qualquer caráter que a destacasse de outra carteira qualquer, parecia destinada ao destino de coisas que desaparecem e logo se evaporam
Palavras que existem mas que ninguém diz
Existe, toda a gente sabe que dromedário é um bicho e camelo é outro, mas na vida real vai tudo corrido a camelo
O Navio de Teseu
Opinar com veemência é atentar contra esta fluidez evidente. Uma crença profunda aprofunda uma profunda descrença na vida
O Homem Mais Alto do Mundo
Aquela visão no Luna Park é mais um daqueles mistérios insondáveis que não ouso compreender em que, nalguns momentos, o passado e o futuro falam um com o outro de igual para igual
O alçapão das ideias
As pessoas das ideias não sabem sequer como tirar o talão do estacionamento do edifício onde se pode registar uma patente, quanto mais criar uma empresa
A questão das visualizações do YouTube
A visualização conta logo, mesmo antes de a “vítima” clicar naquela coisa ali em baixo que diz “saltar anúncio”
Atílio e os números
O primeiro prémio não saiu. Saiu em Antuérpia, alguém que sonhou mais, sonhou melhor, com uma mais certeira e abençoada sequência numérica
Aos Quarenta e Três
...e eu, aqui, a dias de fazer 43 anos e a adiar abrir capots e cartas, de calções e chinelos, e sem ler jornais, sem livros de lombada grossa, sem perfume, sem relógio, sem escritório, sem uísque, sem pasta nem fato, sem firma nem escritório
Coca-Cola e Brigitte Bardot
A poesia, a arte, a sublimação das inquietações de cada um através destes preciosos e misteriosos nacos de melodia e palavras de três minutos e meio, não se procura. Talvez se encontre, mas não se procura
As mulheres e os homens
Será que os nossos filhos vão seguir as pisadas dos pais? Ou vão ser uns meninos da mamã, a fumar à mesa enquanto auscultam nos telemóveis a cotação das bitcoins (...)?
Sapato de fivela em Porches
Esta história foi-me contada na primeira pessoa pelo sapato, por esse sapato. Tinha sido transportado até ali na boca dum cão abandonado. Um cão de muitas raças e portanto de nenhuma
Velho eremitão
Nunca me deu para brincar, dava-me sim para ficar a olhar para as coisas e hoje em dia é igual, não entendo sequer o porquê de as pessoas se aborrecerem de estar sozinhas
O meu 2020
Lambuzei-me nas coisas que gosto de fazer, nas quais me sinto útil, fértil. Gravei, escrevi, regravei, apaguei, reescrevi. Passei todo o tempo com a minha família e para passar tempo com as coisas (...) de que se gosta é preciso tempo
A manhã de Sónia
A Sónia, de dez em dez segundos, a avivar o telemóvel com um golpe rápido e automático de polegar oponível, e nada, nenhuma mensagem, chamada, nada, que é do Gusto?