O título ministerial não o tornou mais solidário, mas tirou-lhe tempo para se dedicar aos outros, pelo menos nos moldes em que costumava fazê-lo. “Há muito que vesti a camisola do voluntariado”, diz à VISÃO Pedro Mota Soares, que, aos 37 anos, abraçou outra forma de se dedicar à causa pública, entrando para o Governo. O Plano de Emergência Social (PES), apresentado nos primeiros 100 dias de governação, foi até agora a sua marca, nas políticas sociais. Aos que criticam o projeto por ser assistencialista ou caritativo, Mota Soares aponta medidas, no PES, “que visam capacitar os trabalhadores do terceiro setor” e outras que “visam estimular a economia: a economia social”. A propósito da futura Lei do Voluntariado, cuja redação está a cargo de um grupo de trabalho, o ministro promete novidades para breve e até dá alguns exemplos: incentivar programas de responsabilidade social da Administração Pública, baixar a idade em que se pode contratar o seguro social voluntário dos 18 para os 16 anos, e estudar a hipótese de consagrar “bancos de horas sociais”.
O Plano de Emergência Social (PES) tem sido criticado, por alguns setores, como sendo “assistencialista”. Mas qual é a sua génese? Estreitar os laços com as IPSS, dar assistência e socorro básicos ou providenciar instrumentos para fazer face aos problemas?
É importante, nesta altura, termos um modelo de inovação social que possa dar resposta e auxílio a flagelos e carências sociais graves, muitos dos quais se arrastam no tempo. Sabemos que há respostas urgentes que temos de dar, numa altura em que as dificuldades são maiores, e, por isso, criámos o PES, que identifica as situações de resposta mais urgente e que avança focado em novas medidas e novas soluções. Elegemos como parceiros preferenciais as instituições do terceiro setor, as quais, aproveitando as iniciativas do Governo e tendo como base a sua proximidade e experiência, podem dar melhores e mais eficazes respostas sociais. O PES está, assim, assente na promoção e proteção dos direitos dos mais excluídos e de muitos que estão numa situação de grande exposição à crise, o que exige uma resposta social excecional.
A CGTP disse que era um conjunto de medidas paliativas para mascarar a realidade e que leva a situações de falência, em vez de apoiar, verdadeiramente, os trabalhadores e a criação de emprego. Como comenta?
Este programa tem medidas que visam capacitar os trabalhadores do terceiro setor e tem até medidas que visam estimular a economia: a Economia Social. Exemplo disso mesmo, o aumento previsional de 20 mil novas vagas em creches. Mas prevê, também, através do recurso ao microcrédito, a criação de emprego como parte da resposta.
Como funcionará esse programa nacional de microcrédito, destinado a promover a empregabilidade e o empreendedorismo?
O Governo vai, em conjunto com a Cooperativa António Sérgio para a Economia Social (CASES), oportunamente e no âmbito do PES, concretizar a medida através da qual queremos capacitar as pessoas, fomentar a criação de emprego e empreendedorismo entre aqueles que têm maior dificuldade de acesso ao mercado de trabalho. Ou seja, vamos fomentar o autoemprego.
O Estado pretende criar condições ou legislação para a prática do voluntariado?
O Governo vai precisamente mudar a Lei do Voluntariado, por olhar para ele como um dos principais pilares da Economia Social. Mas temos de adequar a legislação que enquadra esta atividade às novas realidades. Pretendemos alterar a lei, assumindo, nesta matéria, uma visão mais ousada e fixando nos 16 anos a idade a partir da qual é permitida a contratação do seguro social voluntário. Vamos, ainda, incentivar programas de responsabilidade social da Administração Pública.
Existe algum país mais avançado a esse nível e que possa servir de exemplo ou inspiração?
Os portugueses sempre souberam, em momentos de dificuldade, estar unidos e encontrar as respostas para ultrapassar as dificuldades. É com este exemplo que contamos.
Há pouco tempo, numa iniciativa da GRACE, disse que o Governo quer encontrar medidas que possam “contagiar a própria Administração Pública, para ter exemplos de responsabilidade social e de ações voluntárias”. Disse também que já existem alguns bons exemplos no Estado. A que se referia?
A responsabilidade social é um dos três pilares do desenvolvimento sustentável. Hoje já existem boas experiências de ações de voluntariado e de responsabilidade social na Administração Pública. Por isso mesmo, queremos promover, a nível da gestão do Estado, um programa nacional de responsabilidade social e promoção do voluntariado para trabalhadores em funções públicas, envolvendo os serviços e os representantes dos trabalhadores. A partir de experiências já existentes, vamos estudar a hipótese de consagrar “bancos de horas sociais”, nos quais os trabalhadores em funções públicas possam desempenhar tarefas de voluntariado. O Estado tem de dar o exemplo! E dou um exemplo, diretamente tutelado por este ministério, que é o grupo MAIIS, criadministraado no Instituto de Segurança Social, o qual tem organizado, com os funcionários, diversas iniciativas de voluntariado.
De que vantagens fiscais ou outras pode um indivíduo ou uma empresa beneficiar pela prática de voluntariado ou mecenato, além de integrar esse valor nas suas deduções fiscais? Esse tipo de dedução vai ou não acabar?
O voluntariado é mais do que uma questão fiscal. Acho que não podemos olhar para esta matéria, apenas nessa perspetiva.
O PES também dá algumas luzes sobre um futuro enquadramento da Lei do Voluntariado. Diz que é um objetivo do Governo promover o voluntariado social, baixando, por exemplo, a idade mínima para prestar este serviço dos 18 para os 16 anos e criando bancos de horas nas empresas. Há mais ideias?
Neste momento, está a funcionar um grupo de trabalho que irá propor as alterações, as quais serão anunciadas em momento oportuno.
O que aconselharia a um cidadão desejoso de, e com capacidade para ajudar o seu semelhante, nesta altura de crise?
Normalmente, são as pessoas mais ocupadas que arranjam tempo e vontade para fazerem voluntariado. Mas cabe a cada um saber quais são as suas mais-valias para desempenhar ações de voluntariado. Ou seja, aquilo que podem dar a quem necessita. Mas podem e devem procurar, junto das inúmeras instituições que efetuam voluntariado, aquela que melhor se adeque ao que estão dispostos a dar e onde possam vir a ser mais necessários.
E a uma empresa?
O know-how de cada empresa é fundamental para ajudar e desenvolver ações de voluntariado. É importante que os empresários percebam que, muitas vezes, o essencial não se limita ao dinheiro investido e que a responsabilidade social é cada vez mais um parâmetro avaliado até pelo consumidor final.
E a um autarca?
Para além do apoio às instituições de voluntariado, que incentivem e deem condições aos funcionários das autarquias para participarem em ações de voluntariado. Os autarcas são responsáveis por grande parte da Administração Pública local, pelo que devem aceitar o desafio que ainda agora falava de o Estado assumir responsabilidade social.
Sente-se pessoalmente mais próximo destas realidades desde que assumiu a pasta da Solidariedade e da Segurança Social? No seu espírito, qual a diferença “antes vs. depois”?
Eu já há muito que vesti a camisola do voluntariado. É certo que, agora, tenho menos tempo, mas posso, quero e devo criar condições para que muitos outros também o façam.