Nas alegações finais do julgamento dos 17 ativistas, no Tribunal Provincial de Luanda, a procuradora do Ministério Público (MP) que sustentou a acusação, Isabel Nicolau, parece ter dado, inadvertidamente, um trunfo à defesa, ao deixar cair a imputação de atos preparatórios para um atentado contra o Presidente José Eduardo dos Santos, substituindo-a pela alegação de “associação de malfeitores” formada para ações de rebelião.
Esta sexta-feira, 1, na reunião que vai juntar as três equipas de advogados dos ativistas, nem deverá ser discutido o facto de não terem tido oportunidade de apresentar a sua defesa perante aquela acusação de última hora. Pelo contrário: será debatida a possibilidade que a súbita mudança da tese do MP abriu para um recurso imediato para o Tribunal Constitucional (TC) das duras sentenças aplicadas, na segunda-feira, 28, por um coletivo de juízes presidido pelo magistrado Januário Domingos.
“A lei, no que respeita ao ato preparatório de rebelião, não determina os pressupostos para caracterizar o crime”, explica à VISÃO o advogado Luís Nascimento, defensor de dez dos ativistas, entre os quais o luso-angolano Luaty Beirão, condenado a cinco anos e seis meses de cadeia. A pena mais pesada, essa, foi aplicada ao professor universitário Domingos da Cruz, oito anos e seis meses de prisão efetiva, autor de um livro que, nos encontros que promoviam, os ativistas debatiam, com vista a ações políticas e pacíficas de contestação ao regime de José Eduardo dos Santos, ao abrigo dos seus direitos constitucionais de reunião e associação, conforme defenderam em tribunal.
Esclarece Luís Nascimento que outro fundamento para um recurso imediato para o TC, passando por cima do Tribunal Supremo, são as perícias, a que chama “devassa de computadores”, que foram feitas pela polícia “sem autorização do juiz competente”. Em resumo, procura-se que os juízes do Constitucional concluam pela existência de uma “associação sem crimes nenhuns”.
UM TRIBUNAL QUE NÃO OBEDECE A ORDENS?
Há uma vantagem evidente no recurso ao TC: “É muito mais célere a tomar decisões do que o Tribunal Supremo”, verifica Luís Nascimento. E existe uma presumível desvantagem – a maioria dos seus 11 juízes-conselheiros, que sentenciam sempre em plenário, foi indicada pelo Presidente José Eduardo dos Santos e pelo MPLA, o partido do regime, que domina o Parlamento. “Há lá pessoas com brio, que, acredito, não funcionam à base de ordens”, contrapõe aquele advogado. “Os erros são tão flagrantes que esperamos que algum órgão ponha ordem no circo”, acrescenta. “Está em causa o descrédito completo do nosso sistema de Justiça, que não abona ninguém.”
O certo é que foi o TC, em dezembro último, a terminar com a prisão preventiva dos ativistas, que ia já em seis meses, decretando que essa medida de coação não se justificava. Colocou-os, então, em prisão domiciliária.
Distribuídos por três cadeias (com exceção do professor universitário Nuno Dala, que se encontra em greve de fome, e do jovem Nito Alves, com a saúde muito debilitada, que estão no hospital-prisão de São Paulo, em Luanda), os ativistas vão aguardar, por agora, o resultado da reunião dos seus advogados.