“Hug Pylons, Not Trees” (não abraces árvores, abraça apoios elétricos). Foi assim que o The Economist fez uma das suas capas em 2023. Embora seja inquestionavelmente mais seguro abraçar uma árvore do que um apoio elétrico, foi com agrado que li esse artigo. Além da transição energética, há uma transição que não deverá ser menosprezada, a transição de um ambientalismo superficial e bacoco para um ambientalismo informado. Assim, para uma transição energética bem-sucedida, existem, por mais voltas que se dê, umas linhas e uns cabos em que se irá inevitavelmente tropeçar: a rede elétrica.
Agora que os índices de qualidade de serviço já chegaram a níveis em que apenas pontualmente temos motivos para nos queixar, percebemos que precisamos de mais potência disponível nas nossas casas para carregar os nossos carros elétricos e eletrificar os nossos consumos domésticos. Além disso, queremos uma fatura de eletricidade verde, com produção de origem renovável. Mais uns tropeções na rede elétrica.
Será que precisamos de construir mais rede ou de a tornar mais inteligente? A resposta é fácil: ambas as respostas são corretas. Mas será isso suficiente? Não.
Este ano, tive a oportunidade participar novamente no Congrès International des Réseaux Electriques de Distribution (CIRED) e foi com agrado que notei que o tema deste ano era Increasing Distribution Network Hosting Capacity (Aumentado a capacidade de acomodação da rede). No CIRED não foi dada uma solução única para os problemas de redes, mas pelo menos a problemática foi abordada de forma estruturada e houve espaço para a discussão de várias ideias, completando o valioso conhecimento teórico da academia com a não menos valiosa experiência prática das empresas de distribuição, transporte, produção e reguladores.
A solução passa por uma coordenação ótima entre novos métodos de planeamento e desenho de rede, uma operação e controlo de rede adaptável e flexível que potencie a capacidade de receção da rede, e, por fim, o desenho de modelos de negócio acompanhados de regulação que permita aos clientes domésticos e às empresas (grandes consumidores, comercializadores e produtores) planear investimentos a longo prazo, integrando estes novos modelos nos seus planos de negócio. Simples, não?
Estes modelos deverão potenciar a otimização do uso da rede elétrica existente, suportando, por exemplo, a hibridização de pontos de injeção existentes e maximizando o potencial de consumo e injeção com contratos de acesso à rede com restrições, tanto para novos pontos de ligação, como para os já existentes. É essencial que a aplicação de limitações à componente de capacidade não firme (restrições ativas e/ou limitações) dos contratos de acesso com restrições tenha um grau de previsibilidade aceitável, com sazonalidade, frequência e duração bem definidos à priori.
É preciso reforçar o investimento em cobre, alumínio, aço e betão nas redes, sem nunca esquecer os sistemas que permitirão a sua previsibilidade, observabilidade e controlabilidade, garantindo sempre o princípio fundamental da transparência. Os investimentos em produção e/ou armazenamento devem ser direcionados para pontos ótimos de gestão de rede, garantindo o alinhamento com o consumo. Além disso, as redes poderão (deverão?) instrumentalizar estes elementos do setor elétrico como ferramentas essenciais no controlo de congestionamentos, regulação de tensão e gestão de correntes de defeito, em benefício mútuo.
Concluo assim que a potenciação da transição energética não depende apenas de desenvolvimentos tecnológicos (e não estou a falar de inteligência artificial; muitas vezes um bom entendimento e aplicação das leis de Ohm e Kirchhoff é suficiente), mas também da eficiente e coordenada integração destes desenvolvimentos com a regulação e metas estratégicas do país.