A partir desta semana os cerca de três mil alunos das nove escolas de Almeirim, no concelho de Santarém, terão grandes limitações ao uso do telemóvel – para as crianças do 1.º, 2.º e 3.º ciclos, a proibição é total, nem durante as aulas nem nos tempos livres; no Secundário, os adolescentes colocam os dispositivos em suportes, nas salas de aula, e a sua utilização nos intervalos está a ser ponderada.
“A situação mais crítica passa-se no 2.º Ciclo: os alunos, no recreio, não estão preocupados em comer, brincar ou ir à casa de banho, só pensam em jogar”, descreve José Carreira, diretor de um dos dois agrupamentos de escolas de Almeirim. “Se fosse só para telefonar… Filmam coisas que não deviam filmar, publicam no Instagram [idade mínima exigida é 13 anos], e é uma ótima ferramenta para fazer bullying”, acrescenta.
José Carreira considera o uso de computadores, tablets e manuais digitais “totalmente positivo”, mas como os kits tecnológicos não chegam para todos os alunos, os professores ainda não conseguem dispensar na totalidade o uso do telemóvel na aula.
O Conselho Municipal de Educação de Almeirim, composto por associações de pais, direções de dois agrupamentos, Direção Regional de Educação e Câmara Municipal, foi unânime na decisão de restringir o uso de telemóveis nas escolas da cidade ribatejana.
A preocupação cresceu no ano passado, entre docentes, diretores, autarcas e encarregados de educação após relatos na primeira pessoa, de estudantes do 3.º ciclo e do secundário, confessando estarem aditos às redes sociais e ao telemóvel – casos de dependência, incluindo física, com ansiedade, suores e dificuldade em adormecer. “Há miúdos que pedem para ir à casa-de-banho [durante a aula] porque não conseguem estar uma hora sem mexer no telefone, sem ir jogar. E isso é uma dependência”, alertou Pedro Ribeiro, presidente da câmara de Almeirim, num noticiário da SIC.
O drama do bullying nas redes sociais
Entre os riscos mencionados pela UNESCO, no seu relatório A tecnologia na Educação (2023), está precisamente o bullying digital, com dados de 32 países a mostrarem que, em média, pelo menos 20% dos estudantes do 8.º ano já foram vítimas.
A medida radical agora adotada em Almeirim já leva seis anos de execução em Santa Maria da Feira. Em 2017, uma mudança ponderada pela direção do agrupamento António Alves Amorim, em Lourosa, foi aprovada num Conselho Geral, do qual também fizeram parte encarregados de educação e representantes dos alunos dos vários ciclos de ensino.
A possibilidade de se poder fotografar ou filmar dentro da sala de aula e nos balneários, deixando professores, crianças e adolescentes expostos nas redes sociais, foi um “bom” argumento para se validar a proibição de telemóveis nos oito estabelecimentos de ensino do agrupamento, com cerca de 1 500 estudantes, dos 3 aos 16 anos.
“Se, sem telemóveis, o bullying existe em pequenos grupos; com fotografias e vídeos, esse ato é multiplicado numa escala muito maior na comunidade escolar”, alerta Mónica Almeida, diretora do agrupamento.
Este ano, também o Agrupamento Gil Vicente, no centro de Lisboa, proibiu o uso de telemóveis em todos os graus de ensino, “com o objetivo de melhorar o desempenho escolar e o ambiente de aprendizagem na sala de aula e de reforçar o recreio como um espaço de liberdade, partilha e convívio”, justifica a direção numa comunicação aos encarregados de educação.
E continua: “A interdição de telemóveis abrirá espaço a um recreio mais ativo, diversificado e saudável. Além dos vários campos de desporto, as e os alunos têm ao dispor “kits recreios criativos” com diferentes jogos que podem requerer, e a biblioteca passou a ter um horário mais alargado, disponibilizando, além de livros, revistas, filmes, músicas e acesso a computadores com internet”.
O telemóvel até pode entrar na escola, mas desligado e dentro da mochila. Se um aluno for apanhado a manuseá-lo dentro da sala de aula terá falta disciplinar e advertência se for no recreio. O comportameto reincidente pode mesmo levar à suspensão do aluno.