Quando um ativista climático irrompeu aos gritos, pelo cenário do último debate televisivo destas legislativas, na Nova SBE, em Carcavelos, onde participaram as oito forças políticas parlamentares, esta sexta-feira, Pedro Nuno Santos começava por dar uma nova versão quanto ao posicionamento do PS após eleições, caso a AD vença com uma maioria relativa.
Só que, quando uma outra jovem ativista projetou tinta vermelha contra a enorme moldura de vidro, que envolvia os candidatos, o líder socialista parece ter ficado tolhido a um ponto, que pareceu não ter conseguido mais libertar-se e mostrar algum fulgor. Todavia, o seu maior opositor, o presidente do PSD, à exceção de se ter apresentado à vontade quando o assunto em cima da mesa foi a Justiça, também não resolveu o tabu quanto à posição dos sociais-democratas se for o PS a vencer.
Quer Pedro Nuno Santos, quer Luís Montenegro acabaram por ser ultrapassados à esquerda e à direita, com Rui Rocha (IL) e Mariana Mortágua (BE) a destacarem-se ora na defesa de propostas concretas para as áreas da Justiça, saúde, economia e impostos (ele), ora no ataque às propostas da direita (ela).
Como se desenhará o futuro pós-eleitoral? Foi com esta questão que o debate arrancou. Segundo Pedro Nuno Santos, ao vencer, o PS irá ser governo nas seguintes condições: se tiver, obviamente, maioria absoluta; se se ficar por uma maioria relativa e consiga, com a esquerda, alcançar uma solução governativa, ou, então (e aí atirou a “batata quente” para Montenegro), se houver uma vitória do PS, mas em que haja no Parlamento uma “maioria de direita” (expressão que ainda não se tinha ouvido ao líder socialista).
Contudo, os socialistas não governarão, mas também não farão cair um governo PSD, se estes último partido vencer. O PS “nesse cenário não criará um impasse constitucional e não apresentará nem viabilizará nenhuma moção de rejeição”. Dito isto, o moderador do debate atirou, face a esta nova fórmula: ““Num cenário de uma maioria de direita? O que está a dizer?”. “No caso de haver uma maioria de direita e o PS ficar em segundo lugar, o PS não inviabilizará” um governo de Montenegro, respondeu.
Quanto ao líder do PSD, que achou – após a declaração de Pedro Nuno – que “está tudo mal explicado no que toca à posição do PS” -, acabou, de novo, por fugir à questão sobre o seu posicionamento face a uma vitória relativa socialista: “Coloquei aos portugueses as minhas condições: Só serei primeiro-ministro se vencer as eleições. Sabem também qual será a minha política de alianças [inclui a IL e deixa de fora o Chega]”. “Não vou perder mais tempo a fazer cenários”, disse, dando por encerrado o tema.
Montenegro “talvez” não faria o mesmo que Albuquerque
Se a saúde e a economia foram divisores de águas, entre esquerda e direita, já quanto à área da Justiça os casos que levaram à demissão de António Costa e Miguel Albuquerque expuseram uma maior cautela nas fileiras à esquerda do PS.
Confrontado com a intenção de Miguel Albuquerque se recandidatar em regionais da Madeira antecipadas, e tendo em conta que além de este ser líder do PSD/Madeira é também seu mandatário nestas legislativas, Montenegro admitiu que “talvez tivesse uma decisão diferente” se estive no lugar do madeirense.
Porém, como pouco mais acrescentou, o líder social-democrata foi atacado por André Ventura, do Chega: “Não podemos dizer que António Costa se demitiu bem e quando toca a Miguel Albuquerque não o fazer”. “Não pedi a demissão de António Costa, só falei depois e disse que a compreendia, porque era o 14º caso de corrupção dentro do Governo. O Governo caiu por incapacidade. Dizer que há uma dualidade de critérios é mentira”, contra-atacou Montenegro, que depois ouviu de Rui Rocha, líder da IL a dizer que, tal como Costa, Albuquerque não têm condições para se manter em funções e ainda se apresentar a umas eleições.
Para Mariana Mortágua, coordenadora do BE, perante todos estes casos, era “importante que o Ministério Público explicasse ao País as suas diligências quando elas têm consequências políticas”.
Mas, o mais interessante neste debate é que, a par de Pedro Nuno e Montenegro, Ventura também se apresentou cauteloso. Nem quando o socialista atirou um “Ventura gosta de fazer de conta que toda a gente é corrupta menos ele”, o líder do Chega se mostrou como nos debates anteriores.
Talvez as sondagens eleitorais, conhecidas uma hora antes, na RTP e na CNN, e que davam uma vitória tímida da AD, face ao PS, e um Chega com um pujante terceiro lugar, tenham deixado os líderes destes partidos atordoados.
Números
Pedro Nuno Santos: “O PSD projeta até 2030 um salário médio de €1 750, quando, hoje, está no acordo de rendimentos, assinado com os parceiros sociais, atingir-se os €1 750, em 2027”.
Luís Montenegro: “Uma trajetória de crescimento [sob o governo AD] vai desembocar, em 2028, num crescimento nos 3,4 ou 3,5%”
André Ventura (CH) apontou que há entre € 1 000 milhões a €3 000 milhões “de desperdício” no SNS sobre liderança do PS.
Rui Rocha: “Um em cada três jovens portugueses emigrado é consequência da governação do PS com os seus parceiros da esquerda; um em cada quatro jovens que ficaram estão desempregados e os outros que estão a trabalhar têm salários baixos”
Paulo Raimundo (CDU) disse que há três milhões de portugueses a ganhar menos de €1000 brutos mensais.
Mariana Mortágua assegurou que “80% dos cheques cirurgia ficam sem resposta”, para contrariar ideia da direita para resolver problemas no SNS.
Inês Sousa Real (PAN): “Temos a ambição de conseguir, até ao final da legislatura, que o salário mínimo atinja os €1 100 para podermos aproximar-nos mais da média europeia.
Rui Tavares acenou com a necessidade de atingir um salário mínimo de €1 150, em 2028.
Os ausentes/presentes
A reboque do tema Justiça surgiu o nome do presidente do governo da Madeira, Miguel Albuquerque, que, apesar de ter apresentado a demissão ao ser constituído arguido no âmbito da Operação Zarco, tenciona não só continuar como líder do PSD madeirense, como a recandidatar-se a um novo mandato nas eventuais eleições antecipadas regionais. Mas logo depois veio à baila António Costa, cuja demissão esteve na origem das eleições legislativas antecipadas, de 10 de março.
Indumentária
Pedro Nuno Santos apresentou-se de fato preto, camisa branca e gravata bordeaux. Também de fato, mas azul escuro, estava Luís Montenegro, com uma gravata azul. André Ventura acompanhou o fato azul com uma gravata vermelha. Rui Rocha apareceu de fato preto e uma gravata preta, com bolinhas brancas. Paulo Raimundo esteve no debate de apenas de casaco, de cor cinzenta, e camisa; tal como Rui Tavares, com a mesma indumentária. Já Mariana Mortágua optou por um casaco vermelho e camisola preta. No caso de Inês Sousa Real, a opção passou por um fato violeta e camisola preta.