É mais um impasse na Operação Marquês: depois ter admitido a hipótese, a juíza de instrução Sofia Pires decidiu, esta semana, enviar para o juiz Ivo Rosa a parte do processo que já estava em julgamento, mas que terá que ser refeita devido a um acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa.
Desde maio que a juíza de instrução tem manifestado uma posição intermitente sobre o que fazer à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa, que anulou a decisão instrutória do juiz Ivo Rosa (de maio de 2021), a qual enviou Carlos Santos Silva e José Sócrates a julgamento por crimes de falsificação de documentos e branqueamento de capitais.No texto da decisão de 2021, o juiz, colocou o empresário Carlos Santos Silva como o único (alegado) corruptor ativo de José Sócrates, contrariando a narrativa da acusação do Ministério Público, para quem o empresário deveria ser julgado por corrupção passiva, em co-autoria com o antigo primeiro-ministro.
Em maio deste ano, e com Ivo Rosa já com juiz desembargador, no Tribunal da Relação de Lisboa, a juíza começou por anunciar o envio do processo para o primeiro magistrado, de forma a que ele, como “juiz natural”, refizesse a decisão instrutória.
Um mês depois, e perante o facto de Ivo Rosa se encontrar de baixa médica, a magistrada judicial assumiu as rédeas do processo. Porém, Sofia Pires não podia, simplesmente, refazer a decisão. Porém, segundo a lei, a decisão instrutória só pode ser proferida pelo juiz que tiver realizado o debate instrutório (alegações finais na fase de instrução). Como Sofia Pires não presidiu a esse momento, a magistrada, a 21 de junho, declarou que iria agendar o debate e, posteriormente, avançar com nova decisão.
Só que, no final do mês de junho, a defesa de José Sócrates, num novo requerimento, revelou que, afinal, Ivo Rosa teve alta numa junta médica e já se encontrava ao serviço. Na sequência desta novidade, Sofia Pires admitiu rever a sua posição, pedindo informações ao Conselho Superior da Magistratura.
Esta semana, após a confirmação do CSM que Ivo Rosa já regressou ao serviço, segundo um despacho a que a VISÃO teve acesso, Sofia Pires declarou ter cessado o impedimento do juiz, ordenando a apresentação dos autos no Tribunal da Relação de Lisboa.
Segundo fontes judiciais, não é certo que Ivo Rosa aceita a competência para refazer a decisão instrutória, já que não se encontra como juiz de primeira instância no Tribunal Central de Instrução Criminal, mas sim como desembargador na Relação de Lisboa. Se esta tese se confirmar, o caso arrastar-se-à mais alguns meses, já que este conflito de competência terá que ser dirimido pelos tribunais, sendo certo que José Sócrates poderá intervir nele com a apresentação de recursos e requerimentos.
A decisão de anular a pronúncia (ida a julgamento) de José Sócrates e do empresário Carlos Santos Silva por crimes de falsificação de documentos e branqueamento de capitais foi tomada em março pelo Tribunal da Relação de Lisboa. O acórdão determinou a remessa dos “autos ao tribunal de primeira instância a fim de ser proferida nova decisão instrutória”. Segundo as juízas desembargadoras Maria José Cortes, relatora, e Maria do Rosário Martins, juíza adjunta, “a nulidade em causa afeta e invalida a decisão instrutória de pronúncia em causa”.
José Sócrates foi acusado em 2017 pelo MP no processo Operação Marquês de 31 crimes, designadamente corrupção passiva, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal, mas na decisão instrutória, em 9 de abril de 2021, o juiz Ivo Rosa decidiu ilibar o antigo governante de 25 dos 31 crimes, pronunciando-o para julgamento apenas por três crimes de branqueamento de capitais e três de falsificação de documentos, juntamente com Carlos Santos Silva.