As leis que regulam a interrupção voluntária da gravidez variam de país para país, impondo diferentes limites ao tempo de gestação em que o aborto é considerado legal e tendo em conta a presença de anomalias fetais ou risco para a mulher. Na Coreia do Sul, no entanto, não existe qualquer legislação sobre o tema e o vazio legal já tem quase quatro anos.
Durante mais de 60 anos, o aborto no país foi considerado crime, punível, no caso de quem o executasse, com uma pena de até dois anos de prisão e de um ano de prisão no máximo no caso da mulher, exceção feita para os casos de violação, incesto e ameaça à saúde da gestante ou do bebé.
Em 2019, o Tribunal Constitucional revogou essa lei e deu à Assembleia Nacional um prazo, que terminava no final de 2020, para apresentar uma nova legislação, com a recomendação de que o aborto fosse tornado legal até às 22 semanas de gestação. O Parlamento falhou esse prazo, a lei anterior já não estava em vigor, as determinações legais para fazer face a esse período entre a revogação da lei e a aprovação de uma nova expiraram e… o aborto tornou-se, por falta de legislação, legal em qualquer fase da gravidez.
“Se não há uma lei a criminalizar uma conduta, então não há crime em levar a cabo essa conduta”, resume, em declarações à CNN, Cho Hee-kyoung, professor de direito na Hongik University, em Seul.
O que começou por parecer uma vitória para os ativistas que defendiam o fim da criminalização do aborto transformou-se numa sucessão de tentativas de legislar sobre o tema, sempre com a oposição de vários grupos religiosos.
Voltemos à história da influencer. A jovem, na casa dos 20 anos, publicou um vídeo no YouTube, em julho passado, onde alegadamente documentava a experiência de interromper a sua gravidez às 36 semanas e começou, de imediato, a ser investigada.
Na ausência de regulação, tanto as mulheres que desejam abortar como quem realiza a intervenção movimentam-se numa grande zona cinzenta entre o que é legal e o que não é, por estar abrangido por outras leis. E é por isso que a jovem está a ser procurada por homicídio.
Segundo a CNN, sabe-se que a interrupção da gravidez foi feita num hospital, por um obstetra de outra unidade. Além deste médico e da mulher, as autoridades estão ainda a investigar, pelo menos, mais cinco funcionários que terão participado na intervenção e um intermediário.
Fonte da polícia disse à cadeia norte-americana de informação que o registo hospitalar refere um nascimento já sem vida. Mas se se provar que não se tratou, afinal de um nado-morto, a jovem pode ser acusada de homicídio.