Tal como o Pacífico tem a sua Grande Ilha de Plástico, também no Atlântico existe uma zona gigante de acumulação de lixo marinho − e fica mesmo a sul dos Açores. Christopher Pham, cientista no Okeanos (Instituto de Investigação para as Ciências do Mar da Universidade dos Açores), explica que “não chega a ser bem uma ilha, porque a maioria dos plásticos são minúsculos”, mas que é realmente enorme e “vai até às Bermudas”. Muitas vezes chega também às praias açorianas: “As pessoas não têm noção, mas temos uma das praias mais poluídas do mundo, aqui mesmo, no Faial.” Depende dos ventos e das correntes, mas quando estão de feição chegam a acumular-se 12 mil pedaços de plástico por metro quadrado na praia do Porto Pim. “Quando mando fotografias aos meus colegas lá fora, até no Havai ficam chocados”, exclama.
Felizmente, não é um problema comum a todo o arquipélago que, na sua maioria, continua a ser o paraíso azul e verde que o turismo vende − e os cientistas confirmam: “A riqueza do mar dos Açores é incrível e não para de nos surpreender”, diz Christopher. Refere-se, por exemplo, à recente descoberta de vastos jardins de corais de profundidade realizada pelos seus colegas do Okeanos: “Não tínhamos ideia de que esses corais existiam, e estão, na sua maioria, bastante bem preservados.” Um achado só possível porque no instituto “inventaram” umas câmaras de profundidade low cost: “Sem elas não os podíamos ter descoberto, porque não temos orçamento para usar robôs de profundidade normais”, explica.
Foi por perceber estas duas realidades: de um lado, “uma riqueza natural incrível” e, do outro, “uma vulnerabilidade provocada pelo isolamento, pela falta de meios, pela presença de lixo marinho, e por ameaças como a mineração do mar profundo e a pesca ilegal” que Christopher Pham, mais uma colega do OMA, o Observatório do Mar dos Açores, decidiram candidatar o arquipélago ao estatuto de Hope Spot, um projeto desenvolvido pela Mission Blue Foundation, da lendária bióloga marinha Sylvia Earle.
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Lançados em 2009, os Hope Spot representam áreas vitais dos oceanos para a sua sobrevivência, mas que têm as comunidades locais dependentes e envolvidas na sua preservação. É o caso dos Açores, que há muito abandonou a caça à baleia, por exemplo, substituindo-a pelo Whale Watching e pelo turismo sustentável. “Já conhecia a Sylvia Earle de nome, claro”, começa por explicar, “mas foi através de um trabalho com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) que descobri este projeto e percebi que fazia todo o sentido para nós − até porque, quando olhávamos para o mapa da rede, não havia aqui nada, no meio do Atlântico…”
Do lado da Mission Blue, a candidatura foi “muito bem recebida, porque não existem muitos outros Hope Spot que cumpram tão bem os requisitos”. De facto, quando visitou o arquipélago, em 2021, Sylvia Earle chamou-lhe um “íman para a vida” e um “lugar realmente mágico”. Em cada Hope Spot, a Mission Blue nomeia um “champion”, um representante da área na rede (já com 130 lugares) e que está diretamente envolvido na sua preservação. “A ideia é que exista um acompanhamento, e se criem grupos de apoio para que todos possam aprender e ajudar-se mutuamente”, conta-nos o nosso “campeão”.
Christopher Pham, como o nome deixa adivinhar, não é natural dos Açores. Fez aqui a sua tese de doutoramento, sobre o Impacto das Pescas no Mar Profundo, mas nasceu em Genebra, filho de mãe francesa e pai vietnamita. Talvez por ter passado a juventude rodeado de montanhas, nunca teve grandes dúvidas de que queria dedicar-se ao mar. A relação com os Açores surge depois de ter terminado o mestrado (no País de Gales) quando encontrou aqui o seu primeiro emprego, ao abrigo de um programa europeu. Chegou em 2004 e nunca mais saiu, nem está a pensar fazê-lo: “Para quê? Tenho aqui tudo o que preciso: os meus amigos, a minha música… [também toca numa banda no Faial].”
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Queixa-se, no entanto, que já não sai para o mar como gostaria – “passo muito tempo no gabinete a tratar de papelada” –, mas ainda consegue participar nalgumas saídas de campo, para estudar o impacto do lixo marinho nas diferentes populações de tartarugas ou de cagarros, ave marinha emblemática da região, ambos com taxas de ingestão de plástico muito altas e mortalidade elevada – “encontrámos plásticos no estômago de 90% dos indivíduos”.
Outra das teses de doutoramento que acompanha procura descobrir o impacto do plástico nos peixes de profundidade, “já que o lixo que vemos à superfície é apenas a ponta do icebergue e a maior parte do plástico vai parar ao fundo do mar”. A propósito, ainda se recorda quando desceu aos mil metros de profundidade a bordo de um submarino: “Uma experiência inacreditável, mas, infelizmente, qual foi a primeira coisa que vi quando lá cheguei? Lixo, plástico.”
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