Clang clang. Estremece-se com o som inesperado quando é mexida uma cortina da grelha metálica que integra o novo espaço da loja e da livraria do MASVS, ecoando os minuciosos puzzles de Vieira da Silva, agora multiplicados pelos tetos espelhados na nova identidade visual pensada pelos designers Pedro Falcão e Fernando Brízio para o Museu Arpad Szenes-Vieira da Silva.
A escala da casa mantêm-se intimista, um “pequeno bijoux” como descreve o novo diretor, Nuno Faria. “Abrimos o Museu à luz”, diz, apontando as subtis mas determinantes alterações arquiteturais como a abertura das “claraboias” no teto e a abertura à amplitude da nave principal.
A instituição está a abrir as asas – uma metáfora que se reflete nas obras patentes e no título da exposição inaugural, 331 Amoreiras em Metamorfose. Veja-se, aliás, uma das primeiras obras a receber os visitantes: o desenho Vieira allongée (1964), com a figura reclinada, como a de um inseto encasulado, de Maria Helena, feito pelo marido Arpad, ou as asas de borboletas, os corpos em transição ou evocação de outra coisa qualquer, e os caules e plantas e troncos de árvores semeados em várias obras.
Esta é uma primeira exposição que se dividirá em cinco momentos ao longo de 2025. O primeiro, O Tecido do Mundo, recorda o passado da Fábrica dos Tecidos de Seda e as 331 amoreiras aqui plantadas à época do Marquês de Pombal, e puxa fios conceptuais com obras “que se ecoam umas às outras”, sublinha Faria à VISÃO: “Há uma poética neste projeto: esta montagem estabelece rimas, ritmo, cortes, uma determinante voz.”
Os textos de acompanhamento das obras, evocativos em vez de explicativos, contribuem para a reverberação crítica – e as palavras plasmadas na parede do poeta Ovídio, “Tudo se transforma, nada morre”, estabelecem essa passagem simbólica entre os testemunhos das antigas tecelãs, a tradição oral, e os fios e filamentos trabalhados nas obras em que vegetal, animal e humano criam uma tessitura de memória e metamorfose e futuro.
“Vejo Vieira da Silva como uma aracne, uma aranha que trabalha com fios, num fazer e refazer interminável, uma voz constante”, descreve Nuno Faria. A partir daí, puxou os fios e criou constelações com outras vozes e corpos, juntando-os às obras do casal Vieira e Arpad.
Entre cúmplices e artistas contemporâneos, “escutam-se”, por exemplo, Ana Hatherly, Hein Semke, Lourdes Castro, Paula Rego, Cesariny, Escada, Josef Albers e Robert Rauschenberg, Ilda David, Gaëtan, Rui Moreira, Pedro A.H. Paixão, Maria Capelo ou Mumtazz. Uma trama de vozes para o futuro.
331 Amoreiras em Metamorfose – O Tecido do Mundo > Museu Arpad Szenes-Vieira da Silva > Pç. das Amoreiras, 56/58, Lisboa > T. 21 388 0044 > até 9 fev, ter-dom 10h-18h > €4 a €7,50, grátis para residentes em Lisboa e ao domingo