Listen tem pouco mais de 70 minutos de duração, mas contém cenas difíceis de esquecer. De forma muito realista, o filme (que chega às salas nesta quinta, 22) transporta-nos para um agregado familiar português numa cidade inglesa, não nomeada. O contexto é difícil: o pai, sem emprego fixo, está à espera de pagamentos que teimam em atrasar-se; o aparelho auditivo da pequena Lu avariou-se, o que separa a menina surda do mundo dos sons; o filho mais velho, de 12 anos, está em casa cheio de febre; a mãe não tem mãos a medir, cuidando do seu bebé sem deixar o trabalho como mulher a dias.
O contexto acaba por chamar a atenção dos serviços sociais, que optam por, numa operação relâmpago com a ajuda da polícia, retirar as três crianças aos pais (excelentemente interpretados por Lúcia Moniz e Rúben Garcia).
Percebe-se, desde início, que a realizadora Ana Rocha de Sousa (que coassina o guião com Paula Alvarez Vaccaro e Aaron Brookner) quis evitar a armadilha do maniqueísmo: aqui não há bons e maus, não é uma história que se conta a preto e branco, antes explorando todas as zonas cinzentas. Nem a família parece isenta de responsabilidades, nem a máquina do Estado é retratada, simplesmente, como uma burocracia sem coração. E ainda assim…
Sabendo que a história aqui contada tem raízes bem fincadas na realidade britânica atual, é inevitável sair da sala de cinema com várias inquietações e questões na cabeça (até porque o fim é, como nas nossas vidas, aberto para um futuro que não conseguimos adivinhar). Depois de investigar este assunto a fundo, Ana até garante que a realidade é, demasiadas vezes, bem pior do que a retratada no seu filme.
Se este é um cartão de visita do cinema que Ana Rocha de Sousa quer fazer, pode bem ser resumido nesta fórmula: “Identifico-me, sobretudo, com o cinema de autor, mas acredito que se o cinema não chegar às pessoas não está a cumprir a sua finalidade, a sua missão.”
Listen > De Ana Rocha de Sousa, com Lúcia Moniz, Sophia Miles, Ruben Garcia > 74 min.