Dezoito anos depois de Água e Sal (de Teresa Villaverde), Maria de Medeiros volta ao cinema português, para contracenar com o escultor Pedro Cabrita Reis, Nuno Lopes e Catarina Wallenstein, em Mar, de Margarida Gil. O regresso de Maria de Medeiros, que tem feito carreira a partir de França, adquire, logo à partida, um valor simbólico. A atriz estreou-se em Silvestre (1982), filme de João César Monteiro, produzido por Margarida Gil. A sua presença aqui torna-se, assim, também, uma homenagem ao próprio João César. Ainda para mais, percebendo-se que o veleiro onde decorre quase toda a ação do filme se chama À Flor do Mar (outro conhecido filme do realizador).
Mar encarna essa muito portuguesa ideia de viagem. Cinco personagens partilham um espaço exíguo, mas com um horizonte ilimitado. São personagens-tipo, quase como as de um auto de Gil Vicente, que estão ali em representação de muitos outros. Mas, ao mesmo tempo, a realizadora desconstrói estereótipos, dando às personagens a espessura necessária para a sua humanização. Francisca é uma mulher snob, bem posicionada na vida, que avança pelo Mediterrâneo à procura de um filho que talvez não seja mais do que a própria Europa. O capitão, um inspiradíssimo Nuno Lopes, é o anti-herói por excelência, Cristo e Judas. Pedro (Cabrita Reis) é o comandante, charmoso e complacente, epicurista e cínico, que se dedica ao tráfico de arte sacra. Lili (Catarina Wallenstein) é uma cantora e dançarina, leviana e provocadora, humana e pragmática, que representa o povo.
Todos eles lidam com a própria viagem mas também se vão definindo pela forma como se posicionam em relação aos elementos externos, personificados, sobretudo, na personagem do refugiado, mas que também se concretizam, de forma evidente, na tempestade. Mar, com um fino humor, propõe um olhar cético sobre a Europa, através de uma imagética marítima, próxima da nossa História, que talvez tenha como fim a autodescoberta.
Veja o trailer do filme:
Mar > De Margarida Gil, argumento de Margarida Gil e Rita Benes, com Maria de Medeiros, Pedro Cabrita Reis, Nuno Lopes, Catarina Wallenstein e Augusto Amado > 103 minutos