1. “DanSando”, de Luísa Sobral
Fazendo uma amálgama de todas as letras das 11 canções do novo disco de Luísa Sobral e analisando esse material para procurar as palavras mais recorrentes, chegaríamos, estamos certos, a um conjunto de doces vocábulos, com a palavra “amor” e várias conjugações do verbo “amar” à cabeça. DanSando é um disco feliz, em contracorrente com os tempos sombrios e de incerteza que vivemos. É também o disco de uma escritora de canções segura e madura, em vários registos: uma divertida cronista dos costumes, em As Mães de Hoje em Dia; uma simpática anfitriã a falar-nos na primeira pessoa, em Festa Antecipada; uma mulher livre e apaixonada, em O Nosso Amor É (dueto com o brasileiro Tó Brandileone, que é também o produtor do disco) ou em Amo como Eu Sei (com um fraseado que faz inevitavelmente pensar no José Afonso d’ Os Índios da Meia-Praia). Superado o desconforto do aparente erro ortográfico do título (Luísa evoca o olhar poético de Sophia, que dizia que “dançar” se devia escrever com “s”, uma letra com muito mais movimento do que o “c” com cedilha), este é um disco em que se entra com agrado e facilidade, reconhecendo um cuidado especial nos elegantes arranjos de cada canção. Mas DanSando não é só feito de bons sentimentos, sorrisos e afetos. Há Guerra começa com sinistras sirenes e é uma abordagem bem direta, à distância, ao que se passa atualmente no Nordeste da Europa: “Há guerra e eu a cantar/ a deixar-me ficar…”. Pedro Dias de Almeida
2. “Crónicas”, de João Pedro Coelho
Eis o disco de estreia de um pianista de mão-cheia, João Pedro Coelho, que os amantes do (cada vez melhor) jazz português conhecem de ouvir no disco de estreia do saxofonista Ricardo Toscano. Coelho, 29 anos, estudou no Conservatório de Amesterdão, já depois de se ter licenciado em Jazz na Universidade Lusíada, onde entrou completada, aos 18 anos, a formação clássicas. São 11 os temas de Crónicas, com raízes e inspiração jazzísticas, mas com um pé também na música portuguesa, segundo o próprio pianista, que escolheu dois músicos mais velhos para o acompanhar: Bernardo Moreira, no contrabaixo, e André Sousa Machado, na bateria. Basta ouvir, por exemplo, as pérolas que são (a curta) Valsa da Mouraria, Oferenda em Sol ou Tralha para ficar clara a versatilidade de João Pedro Coelho e percebermos por que continuaremos a ouvir falar dele. Cláudia Lobo
3. “Saudade, Colour of Love”, de Maria Mendes
Elogiada por gente como Quincy Jones ou Hermeto Pascoal (que lhe escreveu Hermeto’s Fado for Maria), a portuense Maria Mendes tem feito uma carreira de alcance internacional (que já lhe valeu nomeações para os Grammys e Grammys Latinos), a partir de Roterdão, para onde se mudou em 2007. Neste novo disco, gravado ao vivo com a orquestra holandesa Metropole Orkest (dirigida pelo pianista e produtor norte-americano John Beasley), ressalta o virtuosismo dos músicos e da extraordinária voz de Maria, ancorada nas técnicas do jazz mas com potencial para todas as liberdades. De alguma forma, é mesmo de liberdade que se trata neste registo. Nas palavras da cantora, a aposta passa, aqui, por “uma abordagem jazzista e sinfónica ao fado.” Basta ler a expressão para se perceber os riscos desse caminho. E o disco arranca logo com versões de quatro clássicos: Com Que Voz, Tudo Isto É Fado, Verdes Anos e Foi Deus. Primeiro estranha-se, depois… depende de cada ouvinte. P.D.A.
4. “Triskel”, de André Rosinha Trio
Triskel é um símbolo celta, com três espirais entrelaçadas, cujo nome vem de uma palavra grega que significa “três pernas”. Tal como na roseta celta, o cruzamento dos três músicos neste terceiro disco do contrabaixista de jazz André Rosinha é gerador de um movimento único. André Rosinha – figura habitual ao lado de Salvador Sobral, com quem toca desde 2015 – compôs a pensar no piano de João Paulo Esteves da Silva e na bateria de Marcos Cavaleiro, movido pelo facto de agora conhecer melhor os músicos com quem havia gravado o seu segundo álbum, Árvore, em 2019. Em alguns dos nove temas, Rosinha explora o uso do arco no contrabaixo e o uníssono entre cordas e piano, num trabalho cujas influências passam, segundo o próprio, pela estética lírica do jazz europeu e pela música clássica. C.L.