Já lá vai o tempo em que, para elogiar uma banda portuguesa, se dizia que pareciam estrangeiros… Mas é precisamente isso que apetece dizer mal se começa a ouvir Above the Wall, primeira faixa de Marrow, feita de loops de eletrónica e uma guitarra bamboleante. A mania das comparações com o que vem de fora não é um vício só nosso, como se comprovou logo em 2011, quando os You Can’t Win Charlie Brown se deram a conhecer com o disco de estreia Chromatic e a insuspeita revista francesa Les Inrockuptibles os emprateleirou, com toda a pompa e circunstância, lado a lado com nomes como Fleet Foxes, Bon Iver, Grizzly Bear ou Devendra Banhart. Na altura, os YCWCB não se assumiam propriamente como uma banda, mas antes como um grupo de amigos, composto por seis músicos da primeira divisão da música indie nacional. O grupo inicialmente formado por Afonso Cabral, Salvador Menezes e Luís Costa, a quem, pouco tempo depois, se juntou David Santos (Noiserv), Tomás Franco de Sousa e João Gil (Diabo na Cruz e Vitorino Voador), cedo se tornou num fenómeno de culto junto dos ouvidos mais atentos, mas nunca deixou ser apenas isso, um projeto lateral, que de vez em quando resultava em alguma coisa – um disco e mais um par de concertos –, para de novo desaparecer por aí.
Mas este Marrow surge como prova do contrário. Pela primeira vez, a banda assume-se como tal e o resultado é um exercício de criatividade e sensibilidade pop, feito dos mais variados ambientes, que surpreende faixa a faixa. Com uma maior presença da guitarra elétrica e dos sintetizadores, que substituem a predominância acústica dos primeiros registos, Marrow é acima de tudo um disco deste tempo – basta ouvir o crescendo de temas como Pro Procrastinator e Bones, ou as bem mais etéreas Mute e Frida para o percebermos. E é por tudo isso que não interessa mesmo nada saber de onde vem esta música, se de Lisboa, Londres ou Nova Iorque…
Ouça aqui a música Pro Procrastinator