Nasceu em meados do século passado, em 1951, dois dias antes do feriado de São João, com toda a pompa e circunstância. Um baile de gala com duas orquestras no Salão Luís XVI (atual sala Dona Filipa) inaugurava nesse dia “o mais moderno hotel do País”, descreviam os jornais da época.
Projetado pelo arquiteto Rogério Azevedo, discípulo de Marques da Silva, a mando do comendador Delfim Ferreira (que, em 1955, compraria a Casa de Serralves), o Hotel Infante Sagres “da mais elevada categoria, digno de acolher as personalidades de maior representação e os turistas habituados ao Grande Mundo”, escrevia O Comércio do Porto, marcou o Porto burguês durante décadas.
Ao longo de 73 anos, na esquina da Rua de Ceuta com a de Avis, o primeiro hotel de cinco estrelas da cidade deu guarida a vários notáveis. De Mário Soares (que escolhia a suíte presidencial, no primeiro andar) ao Dalai Lama, de Bob Dylan aos U2, a Robbie Williams e a John Malkovich, não há quem não se tenha encantado com detalhes como os vitrais de Ricardo Leone que acompanham a escadaria ou as flores em folha de ouro que adornam as portas de ferro.
Na última década, o Infante (como foi sempre conhecido) passou por duas grandes renovações: em 2018, quando foi adquirido pelo grupo The Fladgate Partnership, e nos últimos meses, após a aquisição pelo grupo asiático GCP Hospitality, que o integrou na marca espanhola Hospes Hotels, “devolvendo-lhe o estatuto de Grande Dame do Porto”, anunciam.
Das áreas comuns aos 85 quartos e suítes, tudo foi renovado tendo como inspiração a obra de Luís Vaz de Camões, Os Lusíadas, e a figura do Infante D. Henrique (o Infante de Sagres). “Foi um privilégio poder pegar neste projeto, enaltecê-lo e dar-lhe uma outra narrativa à altura do edifício”, confessa a arquiteta de interiores Francisca Navio, do atelier Nano Design, responsável pela renovação do hotel.
Ninfas do Tejo
A nova história do Infante Sagres começa a contar-se logo à entrada. A receção mudou para a sala Golden Room e, no seu lugar, mantiveram-se apenas as antigas (e grandes) chaves dos quartos. Na zona do lobby, os retratos dos primeiros proprietários (Delfim Ferreira e Sylvia Pereira) convivem com uma decoração mais feminina – as novidades passam por um sofá de veludo verde com encosto ondulado e um papel de parede com flores de cerejeira –, a remeter “para as ninfas do rio Tejo a quem Camões pede inspiração para compor o poema épico”, continua Francisca Navio.
Podemos subir aos pisos dos quartos de elevador (um dos quais mantém o banco de pele de antigamente), mas “quase todos os hóspedes optam pela escadaria para poderem observar os vitrais de Ricardo Leone”, diz Catarina Gomes, coordenadora de eventos do hotel.
Preservar a memória
Para cada uma das seis categorias dos 85 quartos (Superior, Deluxe, Deluxe Premium, Júnior Suíte, Premium Suíte e Royal Suíte), a Nano Design inspirou-se em seis episódios d’Os Lusíadas: Adamastor, Consílio dos Deuses, Inês de Castro, O Velho do Restelo, Ilha dos Amores e O Infante (suíte presidencial). A epopeia dos Descobrimentos é contada através do papel de parede personalizado, da decoração ou das cores dos têxteis. Mas nos quartos (todos diferentes) não faltam detalhes à luz do século XXI, como três garrafinhas, um shaker e limão, para que cada hóspede possa preparar o seu próprio cocktail, ou a possibilidade de trazer o seu animal de estimação (até 15 quilos). O pequeno-almoço é servido no pátio ou na sala do Scarlett Brasserie & Wine Bar (ver caixa Do Mundo para o Mundo).
No segundo andar, a piscina (pequena no tamanho, grande no enquadramento) e as espreguiçadeiras continuam a ser um refúgio no meio da cidade. Nos cinco pisos, encontram-se peças antigas como uma arca preta no lobby, uma mesa asiática em chinoiserie, apliques de parede e lustres. “Quisemos manter essa riqueza sem desvirtuar a imagem do hotel, dando-lhe uma nova vida e enaltecendo esses apontamentos que já existiam”, resume Francisca Navio. No fundo, a memória de um passado.
Hospes Infante Sagres > Pç. D. Filipa de Lencastre, 62, Porto > T. 22 339 8500 > a partir €380
Scarlett Brasserie & Wine Bar: Do mundo para o mundo
Instalado no lugar onde funcionou o Vogue Café e do qual mantém a decoração de Paulo Lobo, o Scarlett Brasserie & Wine Bar está ligado ao Hospes Infante Sagres através de um pátio com um jogo de padrões a preto e branco a cobrir o chão (tem entrada também pela Rua de Avis). Trata-se do primeiro Scarlett na Europa, marca que está presente em Banguecoque, Singapura e Hong Kong, e quer ser um restaurante-bar aberto à cidade. “Começou por ser um pop-up, mas o Scarlett vai continuar no Porto”, diz Catarina Gomes, coordenadora de eventos do Infante Sagres.
A carta de inspiração francesa, com assinatura do chefe de cozinha Charles-Edouard Le Tallec, vai desde o brunch (sáb-dom 12h-17h) aos cocktails de autor (€10-€14) que se saboreiam pela noite dentro com música a acompanhar. “É um restaurante do mundo para o mundo”, resume Catarina enquanto nos dá a provar umas refrescantes ostras da ria de Aveiro (€7, 3 unidades). Nas entradas, saboreámos ainda os croquetes de alheira e o carpaccio de novilho (€7-€8). Dispensámos a sopa de cebola gratinada, mas deliciámo-nos com o risotto de tinta de choco e polvo grelhado (€22) e a sapateira com tomate e abacate (€16). No cardápio, não faltam os franceses croque monsieur e rillettes de porco, ou os portugueses arroz de marisco e bacalhau de meia cura (€24-€26).
À mesa, a ideia é partilhar, pelo que a tábua Scarlett (5 queijos, 5 enchidos e 1 patê, €32) pode ser uma boa opção para acompanhar com um copo de vinho (há mais de 70 referências). Terminámos o nosso almoço com um estaladiço napoleão mil-folhas (€8), mas podíamos ter-nos despedido com um crème brûlée.
R. de Avis, 10, Porto > T. 93 210 1833 > seg-dom 12h-23h