Aos 40 anos, Ljubomir já viveu mais tempo em Portugal do que na Bósnia, onde nasceu. Não trocava o nosso país por nada e, no entanto, já era tempo de se reconciliar com o passado. A sua história, conta-a num menu, que é como um livro, à volta de uma mesa de 12 lugares, a puxar à conversa e à gargalhada. Bem-vindos à Bósnia, o primeiro momento, faz-nos viajar: pão da mãe Rosa, acompanhado das especialidades jugoslavas ajvar, kajmak, pasteta, stelja e “manteiga” do mar. Chegam em loiça comprada em Sarajevo, onde Ljubomir levou parte da equipa para conhecer as suas origens. A partir daqui, havemos de descobrir por onde andou o chefe em pesquisa, momentos que o marcaram, ingredientes que gosta de usar e tudo o mais que lhe deu na real gana.
A abertura do novo 100 Maneiras – na mesma Rua do Teixeira onde o restaurante funcionou durante dez anos, mas agora no número 39 – também tem o que contar. Quatro anos de avanços e recuos, e nem o facto de o fogão de uma tonelada (desenhado em Itália) não passar no portão o fez desistir. Tiveram de destruir uma das poucas paredes, sim, mas ele ali está, na cozinha que podemos espreitar para ver um chefe feliz. O restaurante tem 32 lugares, divididos por três salas (Estufa, Mesa de Jantar e Sala dos Fundos), em tons de castanho e preto, paredes descascadas até ao tutano e muito veludo, com o dedo da designer Nini Andrade Silva. Também há um bar de cocktails (são sete, stirred not shaken, e mais quatro clássicos) e na carta de vinhos contam-se, pelo menos, 100 rótulos.
Um branco Quinta do Síbio acompanha as entradas e, até ao 1º e 2º capítulos (pratos principais), tudo se come à mão, ao som de Kusturica: lollipop de beterraba com coentros, lampreia à minhota (quem disse que este prato não pode ser bonito?), cabeça de carabineiro desidratada com especiarias e lima, bola de polvo, especiarias e picante, charuto de Sarajevo (espuma de batata, pão de chá fumado e torresmo ripado) e salada mista (um coração de alface com anchovas, trufa preta e parmesão). Depois, de faca e garfo, mergulhamos no mar para saborear o lingueirão (o molho, bebe-se no fim, sem cerimónias), a cavala, o salmonete e a língua de bacalhau. Tubérculos e leite de amêndoa, um prato vegetariano, mostra que este é também um caminho que Stanisic anda a trilhar, mas para explicar A Última Ceia, damos a palavra ao chefe. “Cabeça de vaca, cozinhada durante sete horas, a única coisa que o meu pai fazia para nós.” A carne desfaz-se e come-se em pão somun, com natas de trufa, cebola frita e picante – à mão, pois. Saltamos o Posfácio e a Conclusão (sobremesas), para falar do menu de cafés, com cinco tipos de serviço distintos, incluindo o bósnio, que nos transporta para as ruas de Sarajevo. Afinal, foi ali que tudo começou.
Mário Matos Ribeiro, fundador da ModaLisboa, desenhou as fardas do 100 Maneiras, em linho orgânico, ao estilo dos Balcãs. Nas casas de banho, há vozes que nos falam ao ouvido: Mandela, Martin Luther King, José Mário Branco, Josip Broz Tito, os sinos das mesquitas muçulmanas de Sarajevo…
100 Maneiras > R. do Teixeira, 39, Lisboa > T. 91 091 8181 > seg-dom 19h-2h (cozinha encerra às 22h30) > menu de degustação (17 momentos) €110 > harmonização de vinhos €60 (6 vinhos), €95 (10 vinhos)