É inevitável entrar por este disco adentro procurando nele sinais da banda de culto que marcou o percurso artístico da sua autora. Kim Gordon tinha 28 anos quando, em 1981, com Thurston Moore, começou uma viagem chamada Sonic Youth. Essa aventura chegou ao fim três décadas depois, em 2011. Agora, aos 66 anos, Kim Gordon estreia-se com um disco em nome próprio, este No Home Record.
A história dos Sonic Youth é tão vasta – com um espectro que vai de canções orelhudas com guitarras em distorção ao lado mais experimental do noise rock – que é fácil encontrarmos neste álbum elementos e códigos que remetem para esses 30 anos, sobretudo para essa última dimensão mais experimental que Gordon também explorou, desde 2012, no duo Body/Head, ao lado de Bill Nace. Mas é justo assinalar que este álbum consegue soar a algo de novo e contemporâneo (nem falta uma canção com o refrão “Air BnB gonna set me free!”), com uma identidade artística própria bem definida. Parte desse resultado deve-se à presença do produtor e músico Justin Raisen, presente em todas as faixas.
Este é o disco que se espera de um ícone da música independente, e com o estatuto de Kim Gordon a fasquia estava bem alta. Tão depressa tem a urgência dos dias que correm e dos códigos de um rock sempre desafiante como revela um saber e uma carga histórica que não nascem de um dia para o outro. A forma como dispara palavras, frases curtas, em Cookie Butter e Get Your Life Back, faz pensar numa tradição de spoken word que vem dos tempos da beat generation, nos anos 60, e que fez escola, por exemplo, no trabalho de Patti Smith.
O poeta Alberto Pimenta, num misto de desabafo e reflexão repentista, dizia (e citamos de memória), “ainda se fala muito em literatura experimental… Como é possível? Não se experimentou já tudo o que havia para experimentar?!”. Talvez sim. Mas há sempre caminho por fazer, até experimentando outra vez.