O entusiasmo (quase infantil, conceda-se) de descer por um alçapão em frente ao número 77 da Rua da Conceição. O trânsito da Baixa, automóveis – e sobretudo o eléctrico – em ambos os sentidos. Uns degraus abaixo, apercebemo-nos de como não teria sido má ideia se tivéssemos trazido umas galochas. Erro de principiante, nestas coisas da Lisboa subterrânea. “Secar de maneira permanente”, diz António Marques, o coordenador do Centro de Arqueologia de Lisboa que acompanhou a nossa visita em abril último, por ocasião do Dia dos Monumentos e Sítios, “poderia pôr em causa os próprios edifícios construídos em cima deste criptopórtico”. Tentaremos, portanto, evitar as zonas com mais água.
Sem o calçado adequado e em bicos de pés, a visita prossegue. As explicações históricas também: as galerias da Rua da Prata datam do século I D.C., foram descobertas no século XVIII, depois do Terramoto de 1755 e, até ao século XX, vigorou a interpretação de Frei Manuel do Cenáculo de que teriam sido umas termas romanas. “Hoje sabemos que não é assim”, argumenta António Marques. “Não se tratava de um espaço público, antes de um espaço reservado. As celas correspondiam a áreas de armazenamento de produtos – muito provavelmente, de comerciantes que tinham as suas lojas aqui em cima.” E o “em cima” sempre presente sobre as nossas cabeças – passa um elétrico e o teto-chão a tremer que nem varas verdes. A propósito: aqui não existe estacaria, a estrutura permite fazer face à instabilidade dos solos e, de certa maneira, funciona como uma plataforma para os prédios à superfície. “Continua válida e continua a servir a cidade. Eis toda a mestria do engenho romano”, comenta o arqueólogo.
As visitas, que por estes dias decorrem no âmbito das Jornadas Europeias do Património, permanecem gratuitas, embora, pela primeira vez, requeiram inscrição prévia. Em três dias é possível organizar os turnos de maneira a entrarem 3500 pessoas (em grupos de 25) pelo labirinto de abóbodas com arcos e abóbadas dentro. Dão jeito, já se disse, umas galochas, sobretudo para pisar a Galeria das Nascentes onde, segundo o povo, correm águas que são boas para os olhos. Crendices à parte, provêm do lençol freático que inunda todo o criptopórtico, são puras ao sair da fenda (atestam os arqueólogos) e, a nós, lisboetas orgulhosos, recordam-nos de como Olissipo foi construída na margem do Tejo.
Galerias Romanas
R. da Conceição, 77, Lisboa
Inscrições através do T. 21 817 2505 ou email museudelisboa@cm-lisboa.pt
25-27 set, 10h-18h