Um grupo de investigadores da Escola de Medicina da Universidade de Washington, em St. Louis, nos EUA, diz ter encontrado um motivo que pode ajudar a justificar o facto de alguns tipos de cancro estarem a aumentar nos jovens adultos, identificando uma ligação com o aceleramento do envelhecimento biológico.
Sabe-se que o envelhecimento é um grande fator de risco para vários cancros, não só devido ao declínio no sistema imunológico – à medida que envelhecemos, este tende a enfraquecer, tornando-se menos eficaz na identificação e destruição de células cancerígenas em estágio inicial – mas também pela acumulação de danos celulares e de mutações genéticas (com o passar do tempo, as células acumulam mutações no seu DNA devido a processos naturais de replicação celular, exposição a agentes ambientais, radiação ultravioleta e produtos químicos, que podem eventualmente levar ao desenvolvimento de células cancerígenas).
Por isso mesmo, investigadores têm procurado entender os mecanismos biológicos envolvidos nessa relação com o objetivo de desenvolverem estratégias de prevenção e tratamento mais eficazes.
Para a realização desta investigação, a equipa analisou os registos médicos de mais de 100 mil pessoas com idades entre os 37 e os 54 anos incluídas no UK Biobank, um grande banco de dados biológicos do Reino Unido, focando-se em nove diferentes biomarcadores que demonstraram ter ligação ao envelhecimento biológico.
A glicose, que se mantém em níveis mais elevados durante mais tempo após as refeições, conforme a idade vai avançando, a creatinina, que pode aumentar no sangue devido à redução da função renal à medida que envelhecemos e a albumina, proteína produzida pelo fígado e que vai diminuindo com a idade, foram alguns dos biomarcadores analisados pela equipa.
Os investigadores também tiveram em conta a contagem dos glóbulos brancos, que tende a diminuir com o envelhecimento devido ao declínio do sistema imunológico, a percentagem de linfócitos (a concentração dos glóbulos brancos relacionados com a função imunitária tende a diminuir com a idade) e o volume celular médio, uma medida do tamanho médio das células sanguíneas, como os glóbulos vermelhos, que pode aumentar com o envelhecimento devido a alterações nos processos de produção e maturação das células sanguíneas.
A proteína c-reactiva, produzida pelo fígado em resposta à inflamação no corpo e cujos níveis podem aumentar devido ao aumento da inflamação crónica associada ao processo de envelhecimento, e a fosfatase alcalina, enzima encontrada em vários tecidos do corpo, como os ossos e o fígado, e que pode também aumentar com o envelhecimento devido a condições ósseas ou hepáticas relacionadas com a idade, também foram tidas em conta.
A equipa introduziu, depois, estes nove biomarcadores no PhenoAge, um algoritmo que combina diferentes biomarcadores para estimar a idade biológica de uma pessoa. A partir desta ferramenta, desenvolvida para analisar de forma eficaz a saúde global e a vitalidade do indivíduo em comparação com a sua idade cronológica, permitiu aos investigadores determinar o envelhecimento acelerado comparando as idades biológicas dos participantes com as suas idades cronológicas.
Além disso, a equipa identificou o número de casos de cancro em idades precoces (que definiu como antes dos 55 anos) dos voluntários presentes no estudo – 3200 casos.
Os investigadores concluiram que pessoas nascidas em 1965 ou mais tarde tinham 17% mais probabilidade de apresentar um envelhecimento acelerado do que as nascidas entre 1950 e 1954.
Além disso, após os dados analisados terem sido ajustados aos fatores que se pensava poderem influenciar os resultados, a equipa concluiu que o envelhecimento acelerado estava associado a um maior risco de cancro, tendo econtrado as associações mais fortes nos casos de cancros do pulmão, estômago e intestino, e do útero.
Ou seja, comparativamente aos participantes que apresentavam o menor índice de envelhecimento mais rápido, os que obtiveram a pontuação mais elevada tinham o dobro do risco de terem cancro do pulmão de início precoce, um risco 60% ou mais superior de desenvolverem um tumor gastrointestinal e um risco mais de 80% superior de terem cancro do útero.
Estudo com várias limitações
Apesar destes resultados, apresentados recentemetne na conferência anual da Associação Americana de Investigação do Cancro (American Association for Cancer Research), em San Diego, os investigadores não encontraram o motivo pelo qual estes tipos de cancro parecem estar mais fortemente ligados ao envelhecimento acelerado.
O facto de os voluntários não terem sido seguidos ao longo do tempo, e de os resultados terem sido obtidos através de apenas uma única análise ao sangue, cria grandes limitações a este estudo.
Apesar disso, Yin Cao, autora sénior do estudo, explica que foi possível observar estes resultados num número elevado de pessoas. “O cenário ideal é termos várias colheitas de sangue ao longo da vida, o que não é viável mesmo em biobancos como o UK Biobank”, refere, acrescentando a importância de se testar também diferentes tipos de populações.