Apesar de os números epidemiológicos estarem a descer, os especialistas garantem que há outros valores a somar na equação que estão a manter Portugal confinado: os internamentos em Unidades de Cuidados Intensivos (UCI). “Para avaliar a situação temos de conjugar vários dados, e quando se inclui as UCI nas contas, então, para que se desconfine com segurança é preciso esperar mais tempo”, diz o investigador Carlos Antunes, lembrando que, de resto, os valores estão a descer: O Rt (índice de transmissão) está, segundo o Instituto Nacional de Saúde Publica Dr Ricardo Jorge nos 0,7 e a incidência situa-se numa média, a sete dias, de 850 casos diários.
“Temos de ter menos de 242 doentes Covid em Medicina Intensiva, além de um RT menor do que 0,7 e menos de 1600 doentes internados ”, avisa João Gouveia”, garantindo que só assim se conseguirá desconfinar e manter os serviços hospitalares a funcionar com segurança. Este número máximo de intensivos resulta de contas simples: corresponde a 85% das camas que vão ficar destinadas a doentes Covid. As restantes têm de ficar para os doentes com variados problemas, e outras camas ainda têm de voltar ao seu destino, como as que pertencem aos blocos operatórios e as salas de recobros. Além disso, muitos profissionais que têm estado a ajudar a tratar doentes Covid têm igualmente de retomar a atividade e voltar aos seus serviços. João Gouveia acredita que a 24 de março se possa atingir aquele valor “seguro” nas UCI.
Também do Governo surge a mesma mensagem sobre a importância e o peso que, neste momento, estes serviços hospitalares têm na decisão de Portugal estar ainda confinado. A propósito, a ministra da Saúde lembrou que se, em agosto, havia 29 doentes internados em cuidados intensivos, nesta segunda-feira, dia 1, estavam 469 nesses serviços.
Mas, segundo Marta Temido explicou numa entrevista à Antena 1, os restantes números apesar de estarem muito mais baixos do que em janeiro, quando o País chegou a estar como pior do mundo, ainda não são os melhores. Em agosto, frisou, havia “270 doentes internados em enfermaria, segunda-feira tínhamos 2.167”. E quanto à taxa de positividade (testes positivos), a governante recordou que naquele mês se situava perto do 1%, e agora está ainda nos 4%. “Portanto, há muitas coisas que, embora hoje — porque já estamos habituados — nos pareçam estar tranquilas, estão longe de estar”.
A mesma opinião partilha o epidemiologista Manuel Carmo Gomes. “Nem todos os números estão baixos. O mais sensível [UCI], não está baixo, está muito alto”, diz, assumindo: “Na minha humilde opinião, ainda não desconfinamos porque parece termos aprendido com a nossa experiência. Esta diz-nos que não se desconfina sem estar preparado. Ou seja, com critérios, com um plano, com uma capacidade de testagem capaz de forte resposta ao que vai acontecer: inevitável aumento do número de contágios. Em termos de vacinação também não estamos preparados.”
Carlos Matias Dias, coordenador do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional Dr. Ricardo Jorge, corrobora e aponta três fatores para não desconfinarmos agora. “Os números ainda são elevados. Temos infecções, internados e internados em UCI que não estão ainda em números desejáveis”. O segundo fator, avança, é que “não não temos uma percentagem suficiente de pessoas vacinadas, ainda estamos longe dos números de que se falam para a imunidade de grupo”. Por último, ressalva, “há alguma atividade do vírus, no que diz respeito às novas variantes, que sabemos que são mais agressivas, e que são um fator que veio dificultar” as decisões.
Carlos Antunes também considera que as novas variantes trazem uma preocupação acrescida. “É importante ter em conta pois quando se começar a desconfinar essas variantes como são mais contagiosas vão prevalecer e crescer mais rápido”, nota o matemático e investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa que tem desenvolvido um trabalho de análise da pandemia com o epidemiologista Manuel Carmo Gomes, lembrando que o documento inglês com o roteiro sobre o desconfinamento em Inglaterra refere exatamente o perigo das novas variantes no impacto no temível Rt.
Por outro lado, acrescenta Carlos Antunes, há que contar com o cansaço da pandemia o que já começa a fazer-se notar e que impede que a incidência continue a baixar tão rapidamente “A velocidade da queda está a abrandar”, avisa, esclarecendo que se até há uns dias, se estava a registar uma redução de 7% na incidência de dia para dia, agora a diminuição é de apenas 3%. “Isto resulta do facto de existirem menos pessoas confinadas, pois segundo os últimos dados, o confinamento está a 69% do que foi em abril passado”, acrescenta, c adiantando que na segunda quinzena de março, a incidência deverá atingir os 500 casos diários.
Aliás, esta terça-feira, António Costa pediu aos portugueses que se mantenham em confinamento e deixou um aviso; As tragédias repetem-se quando os seres humanos repetem os erros que produzem essas tragédias”.