“Foi um apocalipse, um terramoto viral”, apregoou-se, aqui e ali, quando chegaram as primeiras notícias sobre o impacto deste coronavírus em Itália. No início do ano, Bérgamo era uma cidadezinha pacata no norte do país quando de repente se viu como o epicentro da pandemia na Europa. Um dos primeiros eventos de grande propagação, já se sabe, foi o jogo entre o clube local, Atalanta, e o espanhol Valência, considerado mesmo uma “bomba-biológica”. Resultado? Antes de o mundo ter tomado plena consciência da mortalidade do novo coronavírus e de quaisquer medidas preventivas estarem em vigor, já dezenas de milhares de habitantes da cidade sucumbiam ao vírus.
Mas dez meses depois, Bérgamo tornou-se uma espécie de laboratório involuntário, depois de, no fim do verão, a agência de notícias italiana Ansa ter divulgado os resultados de um estudo realizado em todo o vale Seriana, que comporta 38 municípios. Ao todo, mais de 22 mil pessoas – qualquer coisa como 26% da população adulta da região – foram submetidas a exames serológicos que detetam anticorpos no sangue e indicam se já houve contacto com o agente infeccioso – ainda que tenham sido casos assintomáticos. E segundo os dados das autoridades sanitárias, 42, 3 por centos das pessoas desenvolveram anticorpos para o SARS CoV-2.
Hospitais vazios a receber doentes de outras localidades
Será que isso quer dizer que a população reuniu imunidade suficiente para que o vírus não seja capaz de se propagar outra vez daquela forma? Essa a questão que Giuseppe Remuzzi, epidemiologista do Instituto Mario Negri de Bergamo, está agora a tentar compreender, e tudo indica que sim. Veja-se, por comparação, nos municípios mais perto de Milão, a taxa de infeção rondou os 7%, valor muito aquém daquele. Mas mais do que isso, agora que uma segunda vaga está a varrer a província da Lombardia, as infeções na zona de Bérgamo são significativamente mais baixas do que qualquer uma das cidades mais próximas, sobretudo as que tiveram muito menos casos na primeira vaga.
Há de tal forma poucos doentes que agora os hospitais de Bergamo estão a receber doentes Covid-19 de outras partes de Itália, relata a ITV News, que visitou o novo e ultramoderno Hospital Giovanni XXIII, e encontrou as enfermarias para os doentes da pandemia praticamente vazias. Um contraste absoluto com o que se viu em março e abril, altura em que a comunidade médica se viu perante o mais difícil dos dilemas, que era decidir quem tratar e quem deixar morrer.
Toda a região da Lombardia registou mais de 8 mil casos positivos em 24 horas e 181 mortes, dados divulgados este domingo, 15. Em Bérgamo, apenas 354 novos doentes e nenhuma morte.