“O que se passa é inclassificável.” Cecília Vaz Pinto, fisiatra, não poupa nas palavras para exteriorizar toda a sua estupefação pelo total encerramento dos Centros Clínicos dos Serviços de Ação Médico-Social (SAMS) do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas.
A Comissão Executiva do SAMS resolveu encerrar todos os serviços médicos, primeiro o Centro Clínico de Lisboa (junto ao El Corte Inglès) e os chamados periféricos e regionais, como Évora ou Almada, e, depois o Hospital. Aos doentes, escreveu a Comissão Executiva em comunicado, foi dito que recorressem ao Serviço Nacional de Saúde ou à rede Advance Care.
“A gravidade da situação de fechar portas e virar costas aos doentes é gritante”, diz, a fisiatra do SAMS.
O caso explodiu quando apareceu um doente internado no Hospital do SAMS, nos Olivais, em Lisboa, infetado com Covid-19, doente esse que foi testado quando a Direção Geral de Saúde mudou os protocolos e pediu que se fizessem testes a pessoas internadas com sintomatologia respiratória. Médicos, enfermeiros e auxiliares de saúde começaram a fazer testes ao coronavírus e foram detetados casos positivos – ontem, dia 25, segundo o médico do SAMS Augusto Machado Costa, havia, pelo menos, 48 casos confirmados (18 médicos e 30 enfermeiros e auxiliares de saúde).
A partir daí houve uma cascata de decisões da Comissão Executiva, liderada por Rui Riso, o, também, presidente do Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas (SBSI) que detém o SAMS, que culminou com o fecho de todas as unidades de saúde e a entrada em lay off de todos os profissionais.
Primeiro fecharam os Centro Clínicos, por decisão da administração, ficando apenas a Urgência do Hospital aberta. Com o surgimento de mais casos positivos de coronavírus entre o pessoal, o Delegado Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, Mário Durval, mandou encerrar as Urgências do hospital e, no seguimento, a direção fechou definitivamente a unidade hospitalar e os 26 doentes internados foram para outros locais.
Os médicos contactados pela VISÃO e o Sindicato Independente dos Médicos concordam com este encerramento, mas mostram-se aflitos com o fecho compulsivo dos Centros Clínicos onde são feitas, diariamente, milhares de consultas e exames. Dizem que poderia ser executado o sistema de teleconsulta para que os doentes não sejam abandonados, mas desta forma não têm sequer acesso às fichas e historial dos seus pacientes.
Na altura em que estamos “dispensar médicos e enfermeiros não deve ser feito”, refere Cecília Vaz Pinto, e o “Estado e a Segurança Social não podem aceitar este pedido”.
Jorge Roque da Cunha, do Sindicato Independente dos Médicos, diz que “é criminoso, política, ética e socialmente, que o sindicato dos bancários deixe desprotegidas dezenas de milhar de utentes, principalmente diabéticos e cardíacos”, o SAMS, acrescenta, tem “um serviço de excelência” e “não pode haver um aproveitamento oportunista desta crise” ao colocar funcionários em lay off para ser o Estado a pagar parte do ordenado.
Num comunicado aos sócios e beneficiário do SBSI é referido que este lay off “será implementado pelo período em que “decorrer o estado de emergência e até à recuperação da normalidade mínima”, no entanto, a comunicação interna feita aos funcionários, e ao qual a VISÃO teve acesso, diz-se que a medida “tem uma duração mensal a partir da sua concessão, sendo prorrogável mensalmente, até um máximo de 6 meses, estimando-se que o Sindicato recorra à mesma pelo período mínimo de 2 meses”.
Para Augusto Machado Costa, médico de medicina interna, não há “justificação” para o fecho do Centro Clínico de Lisboa e dos regionais. “É uma atitude inconsciente, e estou a ser brando.” Nesta rede de cuidados de saúde “há milhares de pacientes que têm aqui os seus médicos de família e não têm cobertura alternativa.”
Um outro médico, que preferiu não ser identificado, diz que a “decisão foi tomada em cima do joelho em função do pânico que se gerou por haver casos de Covid-19 no hospital”.
O clínico de medicina interna concorda com o fecho do Hospital por uma questão de saúde pública. “Tinha de ser encerrado para descontaminação e, daqui a duas semanas, ser reaberto.” Aliás, Jorge Roque da Cunha, do SIM, contesta a demora das autoridades em fechar as Urgências do Hospital quando foram detetados os primeiros casos positivos de Covid-19. “O delegado de saúde pública terá der explicar porque não encerrou logo aquele serviço”.
A VISÃO tentou falar com a direção do SAMS, mas sem sucesso.