Temos pouca, mas (ainda) consumimos como se tivéssemos muita. As ações de sensibilização, no entanto, estão a fazer efeito. É essa uma das conclusões da conferência “A Água e o Planeta”, organizada pela VISÃO e pela Águas de Santo André, que contou com a participação de Catarina Barreiros, fundadora da plataforma Do Zero, Paula Nunes da Silva, presidente da Quercus, e Sandra Miguel, da Águas de Santo André.
“As pessoas começam a perceber que a água não é um recurso ilimitado”, disse Catarina Barreiros. A influencer lembra que cada um de nós tem de ter consciência do impacto, sobretudo na forma como consumimos em geral e nos alimentamos em particular. “A carne e o chocolate tem um enorme gasto hídrico. Reduzir o seu consumo é uma boa maneira de começar a reduzir a nossa pegada hídrica.” Há outros consumos de água invisíveis que também merecem atenção. “O papel: há anos que não tenho um rolo de papel de cozinha”, garante. “Lavar um trapo gasta menos água do que produzir papel.” E podemos “poupar 200 litros de agua” se em vez de papel higiénico usarmos um duche portátil ou o bidé, lembra Catarina (que deixou de usar papel higiénico em casa). E há outras formas simples de poupança, que ela própria pratica em casa, como usar a água do banho da filha, suja com sabonete, para as descargas do autoclismo, e apostar em roupa usada. “A indústria têxtil consome imensa água. Porque não dar uma segunda vida à roupa?”
Para Paula Nunes da Silva, há ainda muito a fazer no reaproveitamento das águas da chuva. “Já há diversas soluções no mercado, que permitem depois a utilização para fins menos nobres e permitem uma grande poupança.” Não há, no entanto, “nem cultura nem incentivos em Portugal” para este tipo de práticas, diz a ambientalista, acrescentando que “em geral, a nossa qualidade da água de consumo humano é muito boa, de excelência, mas temos problemas de salinidade e focos de contaminação”. “Verificamos ainda grandes discrepâncias entre as regiões, no tratamento das águas: temos casos muito bons e outros maus. Há também problemas com o funcionamento das ETAR. Fizemos um caminho meritório, mas ainda há muito a fazer. Portugal tem uma legislação muito forte, mas a fiscalização falha, e a consequência do crime ambiental, a coima, muitas vezes é baixa.”
As perdas na rede
Sandra Miguel, por seu lado, falou do problemas das alterações climáticas, que estão a tornar o Alentejo mais seco, e que está a obrigar o setor a preparar-se. “Em 2017, o grupo Águas de Portugal desenvolveu o Plano Estratégico de Adaptação às Alterações Climáticas, um processo em que a Águas de Santo André esteve envolvido. Assim, conseguimos identificar as vulnerabilidades dos sistemas e fomos fazendo as adaptações necessárias para aumentar a sua resiliência. No nosso caso passa por implementar medidas que requerem investimentos avultados, como por exemplo a ligação ao sistema do Alqueva, que permitirá recorrer à albufeira quando não houver disponibilidade hídrica na nossa zona.”
É importante que os consumidores façam também a sua parte. “Portugal é o segundo país europeu com maior consumo de água per capita, com 124 litros de água por dia”, lembra a representante da Águas de Santo André. “Temos apostado em ações de sensibilização dos consumidores, sobretudo em escolas. Se conseguirmos sensibilizar os mais novos, chegamos também aos mais velhos…”
Outro problema profundo na gestão da água são as perdas (há concelhos que perdem quase 80% em ruturas e roubos). Uma questão que é particularmente complicada em regiões com menor densidade populacional, como é o caso dos concelhos do Alentejo. Mesmo assim, recorda Sandra Miguel, “desde 2015, [a Águas de Santo André] conseguiu reduzir as perdas em 10%, através de um grande investimento em reparação e substituição de condutas.” Estão igualmente a ser usadas ferramentas tecnológicas que identificam fugas, facilitando o trabalho dos técnicos e baixando o custo das intervenções.