O sistema de justiça é desumano, especialmente para os pobres, migrantes e dependente do poder político nas mais altas instâncias. Os juízes são eleitos politicamente e os do supremo tribunal federal são apontados pelo presidente do país, além de exercerem o cargo de forma vitalícia.
O sistema de educação é elitista e não permite o elevador social. Uma família pobre, se quiser que o filho vá um dia para a universidade tem que conseguir juntar dinheiro desde que ele nasce.
O sistema de saúde é desumano. Quem não tiver seguro de saúde ou for pobre, morre sem assistência, mesmo à porta dum serviço de urgência. O secretário da Saúde é um idiota negacionista anti-vacinas, e está a retirá-las, contribuindo assim para a crescimento de doenças em crianças e adultos que estavam controladas há décadas, além de ter mandado destruir largos milhares de produtos médicos destinados aos países pobres e que deles tanto necessitam.
O sistema eleitoral é desequilibrado e pensado para favorecer tanto um certo conservadorismo social e religioso como o Partido Republicano.
O sistema político é antidemocrático. Pedro Marques Lopes diz que “nos EUA, a violência faz parte do ecossistema político.” Além disso só os milionários se podem dedicar à política, ou então terão que se “vender” a interesses dos grandes grupos económicos do país.
O mundo do trabalho é altamente instável, visto que os trabalhadores podem ser despedidos na hora e sem indemnizações.
O malfadado McCartismo regressou. Ouvem-se de novo acusações patéticas de “comunista” e “radical” contra todos quantos não perfilhem a ideologia trumpista, e a perseguição já começou. Há que queimar os opositores na praça pública, processando-os, prendendo-os, fazendo-os ser despedidos do seu posto de trabalho, e procurando calar toda a comunicação social que não é afeta ao MAGA, através de processos na justiça e do pedido de indemnizações milionárias.
As universidades estão debaixo de perseguição do governo, que as pressiona para fechar a porta a alunos estrangeiros, e que quer controlar o ensino e vomitar quem pensa de forma diferente. Trump está a matar a autonomia universitária.
Concluindo, a separação de poderes – a que os americanos chamavam “checks and balances” – foi destruída por Trump, que quer controlar totalmente o poder executivo, legislativo, judicial e militar. Mas não se fica por aqui. Quer mandar nas universidades, na comunicação social, nas empresas, no regulador financeiro (Fed) e até nas ONGs.
Mas não é tudo. Segundo as suas próprias palavras ainda quer tomar posse da Gronelândia, anexar o Canadá e o Canal do Suez. Além disso está a interferir no poder judicial de países terceiros como o Brasil e chegou a manifestar o desejo de se afiambrar a uma parte da Faixa de Gaza, a nova Riviera, na sequência do genocídio israelita, segundo confissão pública dum ministro do governo de Netanyahu.
Trump não consegue disfarçar a atração por ditadores como Putin e outros. Todavia, este putativo e imaginário super-homem tem a sua Kryptonite, o seu ponto fraco, é altamente vulnerável à bajulação. Mas a bajulação a um aprendiz de feiticeiro no ofício de ditador nunca resolveu nenhum problema de fundo.
A maioria dos americanos pensa que Trump está a tentar exercer mais poder do que os presidentes anteriores. Lamento dizê-lo, mas os EUA estão hoje mais perto duma ditadura do que dum regime democrático de direito. A América já não é o que era. A polarização chegou a tal ponto que o outro já não é um adversário mas um inimigo a abater. Trump está a transformar o país numa sociedade policiada, condicionada, sem liberdade e sem voz. Em suma, numa autocracia a escorregar para a ditadura.
Em tempos, o líder comunista Álvaro Cunhal dizia que a União Soviética era o “sol da terra”. Tolice. Hoje alguns cristãos consideram que os EUA são a “nação de Deus”. Não exageremos.
Os cristãos obcessivamente “escatológicos” e defensores dum certo apocaliptismo parecem estar cegos. Depois de terem passado décadas a fio a tentar identificar a figura do “Anticristo”, e terem andado a apontar como tal diversos papas e líderes políticos ao longo do séc. XX, ainda nenhum deles se lembrou de olhar para Trump nessa condição. O fascínio da figura é uma coisa tramada.
Por estas e por outras é que me sinto cada vez melhor na pele de português e europeu.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.