A penúltima edição de 2022 desta revista ficou marcada por um dos maiores erros de comunicação política de que há memória em Portugal. Em entrevista à VISÃO, António Costa disse (citado na capa da revista): “vão ser quatro anos, habituem-se!”
Em termos estratégicos, foi um erro porque revelou um estado de altivez de que pouco ou nenhum português aprecia.
Na dita capa, António Costa estava sentado de lado numa cadeira, em pose que rapidamente foi alcunhada de “Marquês do Pimbal”. A fotografia foi realmente “assassina”, mas um natural espelho da gabarolice daquela mensagem do primeiro-ministro. Costa ainda tentou acusar a VISÃO de descontextualizar a chamada de capa e de encenar a fotografia, porém, os pergaminhos do Secretário-Geral do Partido Socialista já são amplamente conhecidos.
A arrogância, a presunção, a imodéstia são defeitos seus e da clique que em seu torno se juntou no PS. Por isso, mais do que mostrar a sua confiança de vir a governar durante quatro longos anos, o habituem-se servia para desavergonhadamente mostrar que o iria fazer com absolutismo e soberba. Juntas com a incompetência, a soma é um desastre. Um desastre apenas para o país, claro, porque lá diz o povo: “para quem não tem vergonha, todo o mundo é seu.”
Os últimos dias políticos têm mostrado que a VISÃO não se enganou ao chamar para a capa o “habituem-se”. Tudo aquilo que tem vindo a lume sobre o caso TAP, revela que o Partido Socialista governa com desrespeito, descaramento, dissimulação e infantilidade.
Vemos desrespeito na reunião secreta que o Partido Socialista teve com a futura ex-CEO da TAP, na véspera da Comissão Parlamentar em que a mesma seria ouvida a propósito da indemnização a Alexandra Reis. Imagine-se, tal como oportunamente indicou o Presidente da República, o que seria se um professor reunisse com um aluno, antes do exame, para combinar perguntas e respostas. É precisamente o mesmo caso, desde logo porque as comissões de inquérito se devem revestir de um amplo dever de isenção.
Vemos descaramento na continuidade do deputado Carlos Pereira na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP, ainda que todo o país saiba que participou na tal reunião secreta. E ainda que a Comissão Parlamentar da Transparência e Estatuto dos Deputados esteja a analisar requerimentos sobre um possível conflito de interesses.
Vemos dissimulação na tentativa de João Galamba atribuir a Christine Ourmières-Widener a “vontade” em estar presente na tal reunião secreta, como se a futura ex-CEO da TAP soubesse da agenda de reuniões do PS.
Vimos dissimulação em Pedro Nuno Santos, que negou saber do valor da indemnização a Alexandra Reis. E em Fernando Medina, que nunca confessou a razão do convite a Alexandra Reis para o seu ministério.
E a infantilidade? Essa está escancarada nas mensagens enviadas por Hugo Mendes, ex-Secretário de Estado das Infraestruturas, sobre a alteração do vôo de Moçambique. Aquelas palavras sobre a necessidade de manter o Presidente satisfeito atingem o patamar máximo de decadência do regime. Além disso, está igualmente à vista a imaturidade política de tantos governantes.
Em 2004, o então Presidente da República, Jorge Sampaio, queria muito demitir um Governo que dispunha de maioria sólida. Para isso, dissolveu o Parlamento, invocando motivos que nunca soube explicar. Hoje, quase vinte anos depois, encontramos uma situação praticamente inversa. Temos um Presidente que não quer demitir o Governo, apesar de ter motivos tão evidentes que não precisaria de explicar.
É preciso que Belém use bem um fundamento aplicado de forma extremamente duvidosa em 2004, o regular funcionamento das instituições, para dissolver o Parlamento. E rapidamente! Quando o presente está desta maneira, não há que temer o futuro.
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Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.