O pássaro azul que comanda grande parte dos nossos destinos, foi comprado pelo multibilionário Elon Musk por mais de 40 mil milhões de euros.
Qualquer coisinha assim como um quarto do PIB português. O equivalente a mais de quatro orçamentos destinados ao SNS.
Feitas as contas de mercearia, comparando políticas e falando dum Sistema Nacional de Saúde que é bombardeado todos os dias com críticas e ataques, impõe-se uma análise séria, isenta da partidarismos.
O sr. Musk entrou no Twitter de lavatório debaixo do braço (?!) com aquele ar de boneco da Rua dos Fanqueiros, mas em rico, como se gastar 40 mil milhões fosse a coisa mais fácil e ao alcance de qualquer um.
Para os mais desatentos, Elon Musk é norte-americano (naturalizado) e o Twitter, sendo multinacional, tem uma chancela made in USA.
Os mesmos EUA que se arvoram em paladinos dos direitos humanos, do humanismo etc etc, mas onde se morre às portas dos hospitais por não se ter um seguro de saúde que permita ser atendido.
Esta é uma das grandes diferenças entre a América de Musk e Portugal do SNS. Nunca teremos um PIB , a riqueza, a projeção, a força duns EUA. Mas em Portugal ninguém, mesmo ninguém, morre por não ter dinheiro para ser assistido
Esta é uma das grandes diferenças entre a América de Musk e Portugal do SNS.
Nunca teremos um PIB , a riqueza, a projeção, a força duns EUA. Mas em Portugal ninguém, mesmo ninguém, morre por não ter dinheiro para ser assistido.
Na passada semana tive conhecimento dum caso real passado nos EUA e que foi relatado em documentário por Michael Moore. Um americano, carpinteiro de profissão, terá decepado dois dedos no decorrer da sua atividade. Levado ao hospital e pesquisadas as bases de dados, verificou-se que o seguro que possuía só lhe permitia o implante dum deles. O homem teve de escolher com qual dos dedos queria ficar!
Parece absurdo, diria que podia muito bem ser uma das muitas fake news se não soubesse, em primeiríssima mão, de casos em que expatriados portugueses ao serviço de grandes organizações internacionais e como tal protegidos por seguros de saúde altamente robustos, foram, durante meses obrigados a praticamente “traficar” medicamentos de Portugal para as suas doenças crónicas. Pediam a amigos e conhecidos se lhes levavam o fármaco, sem o qual corriam risco de vida, enquanto a burocracia e o capitalismo imperante via e revia a adequação do mesmo à verdadeira condição da pessoa.
Conseguem imaginar algo assim em Portugal? Que diríamos se acontecesse no nosso País o que sucedeu a um compatriota nosso em viagem pelo país do passarinho azul, que, sentindo-se mal e tendo recorrido a um hospital, à saída tinha uma conta de cento e muitos mil euros para pagar?
Somos um país com poucos recursos, onde nem tudo corre pelo melhor, onde a burocracia impera e ainda está imbuída dum certo espirito da “antiga Senhora”, duma certa propensão para a esgrima dos pequenos poderes. Mas o que nos falta em todas essas áreas, e sobretudo o que nos falta em termos de receitas, sobra-nos, extravasa-nos, em humanismo e noção de solidariedade.
Há quem advogue e clame por menos Estado e mais iniciativa privada. Nada contra a iniciativa privada, embora passe bem sem os Musks desta vida. Reconheço a necessidade da sua existência para uma economia mais sã e forte.
Mas há áreas onde o Estado é fundamental e que, caso se demitisse dessas responsabilidades, estou absolutamente convicta de que todo o edifício social e de valores humanistas se derrubaria. A saúde à cabeça, seguida pela Educação e pela Justiça.
O Sistema Nacional de Saúde não é apenas a maior conquista do pós-25 de Abril: é o maior reflexo duma sociedade unida e solidária. Com inúmeros defeitos. Com vários erros a corrigir. Com a necessidade duma urgente e, diz quem disso sabe, profunda reestruturação. Faça-se, mas que o SNS, como pediu o saudoso António Arnaut, perdure, porque nos dignifica enquanto País e enquanto portugueses.
De que nos servem os sistemas de informação mais sofisticados, grandes empresas gerando enormes lucros, grandes fortunas contidas nos bolsos de meia dúzia, se ao nosso lado se morre porque se é pobre, porque se é estrangeiro, porque se está indocumentado?
Dizia alguém que os verdadeiros paraísos são aqueles aos quais só damos valor quando se perdem.
Eu acredito e tenho a experiência de que em termos de SNS não vivemos num paraíso mas estamos muito perto dele.
Deixemos voar os twitters desta vida, mas preservem-se o direito à dignidade.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.