Sem que apresentasse no programa eleitoral sufragado pelos portugueses, nas eleições legislativas, a intenção de levar a cabo uma profunda alteração da legislação do Trabalho, o Governo, de forma ardilosa e equivocada, apresentou aos parceiros sociais uma proposta, que merecerá o aplauso encomiástico dos patrões portugueses, por nela verem vertidos os objetivos porque sempre se bateram, para exercerem um poder discricionário e arbitrário, dentro das empresas.
Atribuir às leis laborais, a causa de todos, ou quase todos os males, da economia portuguesa, só poderá ser feito, com um viés ideológico, à revelia da realidade e racionalidade económica e social do País.
Quando se esperava a recuperação, mesmo que parcial, de um vasto conjunto de direitos perdidos pelos trabalhadores, nos tempos da Troika, o governo pretende acabar com os poucos direitos que ainda restam, arduamente conquistados, ao longo dos últimos 50 anos de democracia.
Perante novos desafios, que se vão colocando à economia, com a automatização, a robotização, a digitalização, o trabalho dos aplicativos, entre outros, necessitará de legislação adequada, a negociar em sede de concertação social; mas aproveitar essa necessidade com um tsunami legislativo, para desequilibrar e devastar a segurança e estabilidade do emprego, é uma deriva extremista, protagonizada por uma professora de Direito, que espezinha os princípios gerais, e os fundamentos filosóficos do Direito do Trabalho, conforme professado pelas mais variadas escolas de Direito, no mundo ocidental: salvaguardar a proteção do trabalhador, visando equilibrar a relação entre empregado e empregador, tendo como fundamento a proteção (hipossuficiência do empregado), no princípio da continuidade, no sentido de que a relação de trabalho deve ser, preferencialmente continua, na irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, tudo ancorado em valores como a dignidade humana, a justiça social e a necessidade de assegurar o mínimo social e combater a exploração, com o princípio da proteção e da segurança, como seus alicerces principais.
Os fundamentos filosóficos do direito do trabalho estão enraizados na necessidade de uma efetiva proteção social e na busca pela justiça social. Nada disso enforma a proposta do governo, apesar da narrativa manipuladora da titular da pasta do Trabalho.
Se esta proposta fosse avante, assistiríamos à total fragmentação do mercado de trabalho e sua necessária coesão, à precarização mais injusta e descontrolada, sem resolver um único dos problemas propagandeados pela senhora ministra.
No momento em que, quer nos Estados Unidos da América, quer nos países mais desenvolvidos da Europa, empresários e académicos se debruçam sobre o contributo decisivo da felicidade dos trabalhadores, para o sucesso e desenvolvimento das empresas, o Governo português tem como receita, o esmagamento dos direitos e a infelicidade dos trabalhadores.
Tal proposta, mais parece sair do gabinete de estudos da CIP, da AEP, ou da sua Fundação, do que de um Ministério do Trabalho.
Visitei este ano todos os países escandinavos, onde na minha juventude obtive toda a minha formação; em todos eles, independentemente dos governos serem de direita, ou esquerda, me reiteraram o papel decisivo da negociação coletiva e da concertação social, para o seu sucesso económico. Em Portugal a negociação coletiva está paralisada. Essa devia ser a preocupação prioritária da senhora ministra.
Não existe, pois, concertação possível em relação a este pacote laboral, que nada resolverá, a não ser a continuação da política de baixos salários, da quase inexistência de especialização e modernização das nossas empresas, e com isso, a contínua emigração e fuga da nossa mão de obra especializada, e as condições propícias ao agravamento e à exploração da imigração.
Será colocar Portugal no estertor, cada vez mais periférico, e na cauda das economias europeias.
Centrais sindicais e sindicatos, que aceitem negociar tamanha malfeitoria, para o País e para os trabalhadores, estariam a assinar a sua própria certidão de óbito.
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