Barcelona foi, e é, para todos os urbanistas um exemplo maior do que é o planeamento urbano. No entanto, nos últimos 5 anos, pela mão da sua presidente, Anne Hidalgo, Paris está a transformar-se num caso de estudo. A estratégia montada está a alterar por completo a mobilidade, a qualidade de vida e os índices de poluição de uma forma extraordinariamente rápida e impactante.
Nos últimos anos, Paris tornou-se um laboratório urbano para a promoção da mobilidade suave, impulsionada por uma visão clara: reduzir o espaço do carro e devolver a cidade às pessoas. A capital francesa investiu mais de 300 milhões de euros desde 2020 para criar mais de 1.000 km de ciclovias. Projetos como a transformação da Rue de Rivoli em eixo ciclável e a criação de “zonas de encontro” (com limite de 10 km/h para carros) redefiniram a circulação.
Anne Hidalgo promoveu a remoção de 70% das vagas de estacionamento superficiais, além de restringir o tráfego de carros no centro histórico. A meta é tornar Paris uma “cidade de 15 minutos”, onde serviços essenciais estão acessíveis a pé ou de bicicleta.
A par destas medidas que transformaram dezenas e dezenas de ruas de asfalto em locais verdes e aprazíveis, existiu um investimento pesado na rede de metro que foi expandido com quase duas dezenas de novas estações.
Resultados? A poluição no centro da cidade diminuiu 40% em comparação com 2010. O uso de bicicleta aumentou 40% e 50% dos parisienses já não utilizam o carro diariamente.
E Lisboa? Depois de uma década de requalificação urbana, dando espaço, conforto e segurança a peões em praças e avenidas renovadas, a cidade recuou em políticas chave nos últimos 3 anos. Exemplo disso é o desinvestimento em ciclovias. A rede Gira está estagnada desde 2021 com uma mão cheia de projetos de expansão a serem abandonados ou reduzidos. A esta realidade acresce o insuficiente número de bicicletas, estações e os problemas regulares na aplicação.
Agora faço um exercício: recorda-se de alguma obra de requalificação urbana nos últimos 3 anos? Pois bem, sem obra não é possível melhorar o espaço público nem tão pouco mudar a mobilidade da cidade. A prioridade é a mesma que existia no século passado, o automóvel. Mas mesmo nesse âmbito, assistiu-se a um claro desinvestimento (para quase metade) nas pavimentações. Menor investimento, mais acidentes, menor segurança para todos. Propostas como a Zona de Emissões Reduzidas (ZER) foram adiadas, e o Plano de Mobilidade Sustentável 2030 permanece no papel.
Resultado? O tráfego automóvel aumentou 12% entre 2021 e 2023 e os dados de 2024 vão agudizar este problema. A poluição sonora e atmosférica mantém-se acima dos limites da OMS e apenas 2% das viagens são feitas de bicicleta, contra 6% em Madrid ou 15% em Berlim.
Sem visão ou rumo, ainda existem ruas com passeios de 20 centímetros, passadeiras que representam um perigo para os mais idosos, uma poluição que mata de forma silenciosa e uma qualidade de vida que passa ao lado dos Lisboetas. Lisboa não pode ser francesa, mas tem de abraçar o futuro. Perderam-se três anos, é tempo de arrepiar caminho.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.