Para quem sonha ter um filho, perceber que a dificuldade em conceber de forma natural pode impedir a concretização desse desejo é desafiante. Mas mais desafiante ainda é quando a este obstáculo, para o qual a evolução da ciência e da medicina já consegue dar várias respostas, se junta uma limitação financeira. É por isso que o recente anúncio do aumento da comparticipação para 90% dos medicamentos para a infertilidade se reveste de uma importância enorme.
É um facto que para estes medicamentos já havia comparticipação. Mas é também uma realidade, com que se confrontam vários casais, que os custos de tratamentos que, em muitos casos, se prolongam no tempo, acabam por tornar essa comparticipação, que era até agora de 69%, insuficiente.
Desde 2009 que não havia qualquer tipo de alteração a este nível. Mas muito mudou desde então, não só no que diz respeito à oferta de tratamentos, mas também do número de casais afetados por problemas de fertilidade. Atualmente, de acordo com os dados da Organização Mundial de Saúde, cerca de 17,5% da população adulta, qualquer coisa como 1 em cada 6 pessoas, sofre de infertilidade em todo o mundo, o que é um sinal inequívoco da urgência de facilitar o acesso aos tratamentos de fertilidade, que continua a não ser equitativo.
Mas há outros dados que confirmam a importância, e sobretudo a urgência, de abordar este tema: é que a infertilidade está também associada a resultados negativos para a saúde, sobretudo ao nível do bem-estar mental, pelo que os esforços no sentido de reduzir estes problemas representam também avanços na melhoria da saúde global.
Depois, há a ainda a crise de natalidade, generalizada também, e que deve ser cada vez mais um incentivo para a tomada de decisões. Aqui, os números são claros: em 2022, a taxa de fertilidade na União Europeia, ou seja, o número de nados-vivos por mulher, era de 1.46, valor que traduz uma incapacidade de renovação de gerações (que exigiria uma taxa de 2.1). E o que é que isto significa? Muito, sobretudo tendo em conta o impacto demográfico nas finanças públicas e na segurança social, sobrecarregados por uma população cada vez mais envelhecida.
E sim, é verdade que são vários os motivos que justificam esta redução na fertilidade, que incluem um maior acesso à contraceção e aos cuidados de saúde reprodutiva, o empoderamento feminino na força de trabalho e até uma maior igualdade de género. Mas o aumento dos casos de infertilidade tem também aqui um peso, que tem vindo a crescer ao longo dos anos, e que, se fosse endereçado de forma adequada, poderia aliviar significativamente o sofrimento de muitas famílias e contribuir para um futuro mais promissor em termos de saúde reprodutiva.
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