Este domingo, 1 de setembro, o ritual político das rentrées terá um dos seus momentos mais fortes, com os discursos de Luís Montenegro e de Pedro Nuno Santos, quase em simultâneo, a encerrarem as respetivas “universidades” ou “academias” de verão – uma espécie de acampamentos de Escoteiros Mirins das respetivas juventudes partidárias, abrilhantados pelas palestras dadas por alguns adultos notáveis, iniciativa que o Chega, que tanto gosta de brincar aos grandes, também já mimetiza. Depois, fica apenas a faltar a Festa do Avante!, que tem perdido em importância política o que tem ganhado em termos de cartaz cultural. Pelo meio, este fim de semana, tivemos a Iniciativa Liberal a imitar o PSD e a ocupar o Calçadão de Quarteira, com o seu líder, Rui Rocha, a entoar um discurso chatíssimo com a ideia do “governo toranja” (laranja por fora, cor-de-rosa por dentro), o único lance criativo de uma intervenção que, dadas as expectativas criadas por anos de cartazes com piada, se saldou por um monumental bocejo. Quer a IL convencer-nos de que veio para mudar Portugal, apesar de não ter crescido para além dos 5% nas urnas, equivalentes a oito deputados, o que faz esta força parlamentar totalmente irrelevante: não chega para sustentar uma maioria de governo com o PSD e ainda menos para o derrubar. Rui Rocha deve preocupar-se, isso sim, é com a surda oposição interna e com o… “cotrinismo”. Cotrim de Figueiredo conseguiu provar, nas europeias, que vale mais do que o partido. O trabalho, agora, é disfarçar esse incómodo, fazendo dele o próximo… candidato presidencial.
Pelo caminho, André Ventura veio proclamar que o “alarme” causado, neste verão, pelo assunto da imigração justifica a realização de um referendo sobre o tema. Não é que nos dê muita vontade, mas vale a pena gastar umas linhas com isto: Ventura comporta-se como o incendiário que, depois de largar um fósforo aceso na floresta, vem gritar: “Há fogo! Há fogo!” Não, a imigração não é nada o assunto do verão: é o assunto do verão do Chega! Ventura está como Rui Rocha, ambos já perceberam que nenhum deles conta para a grande discussão política da rentrée: o Orçamento. Rocha, porque não tem força. E Ventura, porque só teria força se votasse a favor (ou contra, ao lado da extrema-esquerda e do PS). E o Governo parte (corretamente) do princípio de que vota mesmo contra (uma abstenção será irrelevante), ainda que possa dar a impressão de que não: é que Luís Montenegro não se esquece de como Ventura roeu a corda no caso da eleição do presidente da AR… Portanto, Montenegro não conta com o Chega e privilegia o PS, nas negociações, porque só o voto (a abstenção) do PS conta. E só contam, portanto, dois dirigentes políticos, ele próprio e o líder da oposição. Ventura julga ter encontrado uma alternativa, na sua habitual cassete: um tema suficientemente poderoso para captar as atenções gerais. Como a diatribe contra a imigração – lá está, por ser uma cassete – já não chegava, vem agora com a novidade do referendo. Nada de novo debaixo do sol.
E Pedro Nuno Santos? Bem, o líder do PS tem uma tese clara, embora cínica: “O PS perdeu as eleições, não contem com o PS para muleta do Governo. A direita conseguiu uma ampla maioria, a direita que se entenda.” E ele sabe bem que não é assim, a não ser que, na sua cabeça “binária”, esteja mesmo a ser sincero. Nesta possibilidade remota, para Pedro Nuno não existiriam nuances, políticas diferenciadas ou agendas políticas. Só direita e esquerda! Nunca várias esquerdas e, muito menos, várias direitas. Pedro Nuno não estudou a História ou faz de nós parvos? Nunca ouviu falar de Mário Soares ou está a brincar? Não sabe que uma certa esquerda teria acabado com o PS, se pudesse, nos primeiros anos da democracia (democracia que, decerto, morreria ali)? Ou desconhece que Sá Carneiro barrou a entrada na AD a grupos de extrema-direita que hoje estão no Chega?… Pedro Nuno não é um político impreparado, no que diz respeito à ação executiva. Mas se esta tese fosse mesmo sincera, seria impreparadíssimo do ponto de vista teórico. Desconfiamos, porém, de que tudo não passa de tática. Uns e outros o que querem é subir a parada, mas sem provocar eleições. O PS, porque não ganhará nada com isso. O Chega, porque se tiver o azar de ficar com 49 deputados, em vez de 50 – e, se for culpado por eleições, depois de deitar abaixo um governo de direita, arrisca-se a perder muito mais… –, terá uma derrota histórica. E a AD, porque mais vale um pássaro na mão do que uma maioria a voar.
OUTROS ARTIGOS DESTE AUTOR