Fica apenas a 70 quilómetros de distância de Lisboa, mas parece pertencer a outro planeta. E não é só pelo nome das terras que passamos para lá chegar, como Adão Lobo, Chão do Sapo ou Pragança – se assim fosse, o planeta estender-se-ia por uma mancha grande da zona Oeste, e a Serra de Montejunto ocupa apenas 15 quilómetros por sete.
Na verdade, a Serra parece pertencer a um outro planeta porque é uma enorme barriga verde muito bonita, ainda perservada, um contraste forte com o excesso de construção para quem vem da zona da Lourinhã. ‘Agora vamos ver a Grande mãe’, disse-nos a Marta quando entrámos no carro. Queria mostrar-nos uma das quatro vinhas onde compra as uvas com que faz ‘António’, o vinho que tomou o nome do marido, enólogo, falecido durante a vindima de 2009, de forma fulminante e absolutamente inesperada.
A história é longa, e aqui se contará com o pormenor que merece, mas o que agora nos interessa é Montejunto, cuja encosta norte é visitada por uma brisa atlântica que lhe dá características únicas. É aí que estão as cepas da casta Vital, uma velha casta portuguesa que corre (corria?) o risco de desaparecer ou ficar esquecida, onde Marta vai buscar mil quilos de uva para o seu vinho. António descobriu aquele pequeno quadrado de vinha, onde se chega por terra batida e caminho íngreme, quando um dia ele e Marta foram para ali namorar.
E tinham razão em irem para ali namorar: a vista da Serra, para lá se chegar, é sublime. E quando damos as costas à serra e olhamos para norte, é outra vez sublime.
Quem por ali andar, talvez à procura da Real Fábrica do Gelo (que não conseguimos encontrar), pode voltar a descer pela encosta norte e rumar ao Pereiro e a Avenal, e demorar-se nos desenhos pintados à porta das casas destas aldeias aparentemente sem história. É a tradição dos Bons Reis Magos que dita que na noite de 5 para 6 de Janeiro se pinte na casa do vizinho a inscrição BRM, antecedida de uma estrela e precedida pelo ano. A rematar, um desenho daquilo que se deseja para o vizinho: um tractor, um porco, um burro, uma flor.