O ser humano é, por natureza, um ser social. O nosso cérebro está programado para a interação, para a criação de laços e para a partilha. A exclusão, por outro lado, provoca em nós sentimentos de dor comparáveis à dor física. Esta predisposição para a sociabilização tem raízes na nossa neurobiologia. Somos seres empáticos, capazes de “calçar os sapatos do outro”. Quando testemunhamos alguém em sofrimento, o nosso cérebro ativa as áreas associadas à dor, como se fôssemos nós próprios a sofrer. Apesar desta predisposição natural para a prosocialidade, também é inerente à nossa condição humana a criação de “in-groups” e “out-groups”. Identificamo-nos mais com determinados grupos, por vezes por razões negativas, com um impacto tremendo nas nossas relações e na nossa visão do mundo. A história da humanidade está repleta de episódios extremos onde a exclusão e repulsa de determinados grupos, aliada à propaganda, deu origem a processos de desumanização que culminaram em genocídios como os que sucederam no Ruanda, com uma campanha sistemática de massacres pela maioria Hutu contra a minoria Tutsi, ou nos Balcãs na década de 90, entre tantos outros episódios de má memória.
O voluntariado surge como uma ferramenta poderosa para desconstruir preconceitos e promover a empatia. Ao participarmos em ações de voluntariado, experienciamos novos grupos e pessoas que, à partida, não fariam parte dos nossos “in-groups” habituais. Estas experiências criam novas sinapses no nosso cérebro, transformando a forma como nos relacionamos com o outro. O voluntariado torna-se, assim, um veículo para o desenvolvimento da empatia, com um objetivo último de mudança a três níveis:
- Psicológico: A forma como nos vemos no mundo;
- Conviccional: As nossas crenças sobre o mundo;
- Comportamental: A forma como agimos no mundo.
De acordo com o Gartner Report, apesar de 82% dos colaboradores considerarem importante a sua empresa/organização verem-no como pessoa muito além de apenas funcionário, apenas 45% acreditam que a organização assim o faz.
Isto coloca um desafio na gestão de talento e estratégia de longo prazo das empresas: a identificação com um propósito, valores comuns e criação de impacto.
Um estudo da McKinsey, conclui que para 70% dos funcionários o seu sentido pessoal de propósito é definido pelo seu trabalho, o que ainda se torna mais premente na Gen Z, em que 80% priorizam encontrar um emprego que esteja alinhado com os seus valores e interesses, em comparação com 59% dos Millennials.
O voluntariado corporativo é, portanto, uma ferramenta essencial para a humanização das empresas. Ao promoverem o voluntariado corporativo, as empresas, colocam à disposição dos seus colaboradores uma ferramenta poderosa que beneficia não só os indivíduos, as comunidades, mas também a própria empresa/organização.
Mas como implementar programas de voluntariado corporativo que promovam por um lado, as competências e sentido de pertença da pessoa à empresa, assegurando o compromisso social com as comunidades, pedra basilar da génese do voluntariado?
Alinhamento entre o propósito da empresa e EVP
A definição do propósito da empresa deve ser claro, alinhado com os objetivos de negócio, em parceria com as comunidades, envolvendo stakeholders e demais, e ainda declinando no EVP – Employee Value Propostion – a proposta de valor às suas pessoas, transformando o propósito numa jornada comum de valor.
Estratégia de voluntariado corporativo
Construir um programa de voluntariado de médio-longo prazo, focado em parcerias de com o sector social, envolvendo os colaboradores num ecossistema de impacto. Deste modo, permitimos o envolvimento de cada voluntário com a comunidade com continuidade, adquirindo competências e co construindo o desenvolvimento sustentável das comunidades.
Avaliação de impacto e comunicação
A empresa deve definir e comunicar os objetivos do programa na sua estratégia, e integrar os valores do voluntariado na sua cultura, avaliando o impacto do voluntariado no voluntário; e a transformação que o envolvimento cada voluntário desencadeia na sociedade. A transparência, compromisso e continuidade do programa e resultados obtidos dever ser comunicada, para alinhamento interno e sentimento de pertença.
Nos últimos 3 anos, estima-se que o voluntariado corporativo tenha crescido e ultrapassado níveis pré-pandemia. De acordo com a análise Benevity 2024 State of Corporate Volunteering, 94% das empresas auscultadas têm implementados programas de voluntariado, resultando num número aproximado de 1,4M de voluntários (crescimento de 63% face ao ano anterior). A taxa média global de participação no voluntariado subiu para 9,2%, um aumento de 57% em relação à taxa de participação de 5,9% do ano anterior.
Seja esta a tendência a manter-se, o voluntariado constitui uma oportunidade que transcende a tradicional ideia de mecenato e solidariedade, devendo as empresas olharem como um dos aspetos único e diferenciador, fundamental à manutenção da sua competitividade e sobretudo, humanização.