Desde a infância, sonhei com um futuro melhor, apesar das dificuldades daquele tempo. No meu caso, enquanto regava os campos ou enquanto esperava, deitado sobre os sacos de arroz, sonhava que os moinhos da minha querida aldeia de Ul, em Oliveira de Azeméis, fizessem o seu trabalho enquanto eu sonhava com um futuro melhor. Mas, mais do que sonhar, eu queria fazer.
Em frente à nossa casa, existia uma pequena sapataria e eu, sempre que podia, lá ia apreciar a sua arte e, por vezes, com o consentimento do Ti Zé Tremoceiro, pegar na turquês, na sovela e na agulha. Durante muito tempo, acreditei que poderia ser essa a minha profissão e o meu futuro.
Quis o destino levar-me para uma indústria que estava ainda a nascer: os moldes. Fui o primeiro funcionário da Moldoplástico. Tinha 14 anos e, tal como na oficina do sapateiro, aprendi cada detalhe com os artistas de topo da indústria do vidro, que aplicavam agora o seu conhecimento nos moldes para plástico.
Ainda antes de eu atingir os 18 anos, fundámos a Simoldes numa pequena oficina com 80 metros quadrados. Éramos quatro colaboradores. Vivíamos tempos de pioneirismo porque tudo era novo. Aliás, foi essa incerteza, vivida nos meus primeiros tempos, que moldou a minha forma de pensar até aos dias de hoje: arriscar, empreender e, fundamentalmente, fazer diferente e sempre melhor.
Na minha vida, nunca procurei navegar à vista. Procurei ver sempre para lá do horizonte. Nem sempre correu bem, corri imensos riscos. Mas nunca me conformei e não desisti quando algo não correu bem. Da mesma forma que não sosseguei quando tive sucesso. O sucesso pode ser o pior inimigo do progresso. Para mim, o sucesso serve apenas para ganhar fôlego para encarar com determinação as crises que hão de vir.
Em 1963, mudámos para a primeira fábrica. Passámos de 80 para 800 metros quadrados e 20 pessoas. Ao longo de mais de seis décadas de trabalho, tivemos a felicidade de enfrentar muitos problemas. Uns mais globais, outros mais caseiros. Mas todos interessantes porque nos deram a oportunidade de fazer diferente, de corrigir o rumo, de investir e de arriscar. Nesses momentos, sempre segui o meu instinto, suportado na ideia de que “as crises não duram para sempre” e que “a seguir à tormenta vem a bonança”. Não abdicando de uma serena ponderação e reflexão, muitas vezes as minhas decisões foram no sentido oposto dos conselhos que recebia, e resolvi arriscar: arriscar criando melhores instalações, investindo permanentemente em tecnologia e apostando em mercados desconhecidos. Mas, mais importante do que tudo isso, investindo nas pessoas.
Eu quis sempre os melhores a trabalhar comigo. Formámos imensos profissionais e ajudámos as instituições de ensino a fazer mais e melhor. Se há algo que aprendi logo quando comecei a trabalhar na dureza da bancada de moldes foi que só fazendo bem podemos competir e vencer no mercado.
No Grupo Simoldes, o nosso lema é: “Juntos fazemos melhor.” Foi esse espírito que fez a Simoldes sair da oficina de 80 metros quadrados e estar hoje espalhada pelos quatro cantos do mundo, com cerca de sete mil colaboradores. Com a humildade e simplicidade que sempre pautaram a minha vida, continuo ainda a querer fazer sempre mais e melhor, mas não sou mais importante do que os outros. Eu sou apenas uma peça da engrenagem.
Trabalho publicado originalmente na edição de maio de 2024 da Exame