“A Softinos deverá ser, a curto prazo, a segunda marca portuguesa de calçado, logo atrás da Fly London”, diz Fortunato Frederico, presidente do Grupo Kyaia, certo do potencial da insígnia que nasceu em 2007, sob o signo da suavidade. João Monteiro, gestor responsável pelo projeto, confirma o objetivo. Vender 200 mil pares de sapatos este ano, 95% dos quais no mercado externo, é “uma meta realista”, afirma.
Habituada a crescer ao ritmo de dois dígitos por ano, a Softinos sente-se confortável a acompanhar a velocidade imposta pelo maior grupo português de calçado e não receia assumir a ambição de chegar a 2024 com vendas de 30 milhões de euros, contra os 6,2 milhões atuais, ajudando a Kyaia a cumprir a ambição de estar entre os cinco maiores operadores europeus do sector dentro de sete anos. Só este ano prevê crescer 29%. Para isso aproveita sem complexos as sinergias de grupo e as portas já abertas pela Fly London no mundo, mas aposta num conceito próprio, em que as palavras chave são maleabilidade, suavidade, conforto as tendências de moda não são quem mais ordena.
Quando nasceu, em colaboração com um parceiro alemão da Kyaia que também tinha experiência no sector do calçado, a Softinos alinhou logo à partida na tendência do calçado de conforto, macio e flexível, o que lhe permitiu avançar sem medo de conflitos de interesse com a Fly London, assumidamente posicionada no segmento da moda.
“Em quatro anos chegámos onde queríamos no produto. A imagem de marca demorou mais tempo a trabalhar, mas também já estamos onde queremos, sempre com um investimento controlado, que não passa dos 20 mil euros por ano”, diz João Monteiro, “dedicado a 100%” à gestão da marca nos últimos seis anos.
Filho de Amílcar Monteiro, sócio de Fortunato Frederico, João foi trabalhando na Kyaia enquanto estudava, para ganhar o seu próprio dinheiro, e acabou por chegar à Softinos de forma natural mas inesperada.
Na verdade, estudou Relações Internacionais e nunca tinha pensado seriamente em viver entre sapatos, mas quando acabou o curso o pai chamou-o para uma conversa.
Perguntou-lhe se não queria assumir o desafio de fazer na Softinos o mesmo trabalho que ele estava a fazer na Fly London.
Não houve pressões, mas João sentiu que a proposta era irrecusável e acabou “apanhado pelos sapatos”, a falar diariamente com agentes e distribuidores para saber como estavam a correr as vendas, perceber as dificuldades que sentiam no dia a dia, no terreno. Trabalha em todas as frentes. Está na conceção da coleção ao lado do designer, vai às feiras na Europa, Tóquio, EUA e Canadá, reúne com agentes e distribuidores, acompanha a organização das campanhas de marketing.
Sapatos sem estação
Alguns membros da equipa são comuns à Fly London, desde logo nas vendas, o que permitiu perceber que muitos clientes estão disponíveis para comprar as duas marcas. O designer holandês da Softinos também faz sapatos para a irmã mais velha, Fly London. Na produção, as duas marcas partilham o universo da Kyaia, do chão da fábrica à expedição e serviços comerciais.
Os sapatos, com um preço médio de venda ao público de 100 euros, são feitos em Penselo, Guimarães, mas há uma fase do processo que decorre no polo industrial do grupo, em Paredes de Coura. “É lá que lavamos as peles para a nossa oferta de wash leather (peles lavadas), onde acreditamos estar a criar mais-valias”, diz.
E explica: “Este processo permite reduzir stocks e cortar em 50% o tempo de resposta às encomendas.” Como? A base da pele é sempre a mesma, mudando de cor neste processo de lavagem, o que permite ter as gáspeas (a parte superior do sapato) prontas a mergulhar no tom pretendido. O aproveitamento da pele aumenta e clientes e fabricantes reduzem, assim, os respetivos stocks, a produção pode ser diluída ao longo do ano, evitando os picos sazonais de procura nas diferentes coleções.
Trabalhar livre da ditadura das coleções é, aliás, outro objetivo da marca, que oferece atualmente sete linhas com seis modelos por época. “Em vez de termos coleções de primavera/verão e outono/inverno, queremos ter um produto para vender todo o ano.
Os nossos quatro modelos mais fortes nas vendas já seguem este princípio e dentro de 10 anos gostaríamos de estar a seguir esta linha, até porque as estações estão cada vez menos definidas”, refere o gestor.
Fora de cena, nesta fase, está a abertura de lojas de marca, apesar de João Monteiro receber diariamente e-mails a propor parcerias em vários países. Nesta fase, “a prioridade é aproveitar a boa fase que estamos a viver e explorar ao máximo o negócio no modelo atual, com foco na criação, produção e distribuição de sapatos”, justifica.
Neste modelo, 90% da oferta são sapatos de senhora, até porque as mulheres compram mais sapatos do que os homens, e 85 em cada 100 pares são vendidos em lojas de sapatos multimarca. Já as encomendas online garantem 15% das vendas.
A Alemanha tem-se destacado como principal mercado, com mais de 30% das vendas, seguida do Reino Unido, mas a rota das vendas está a dirigir-se cada vez mais para os EUA, que já são o maior clien te da Fly London e prometem ser também o principal destino da Softinos já em 2018, depois de a marca ter conquistado “dois motores potentes no país”, a cadeia de distribuição Nordstrom e o canal televisivo de vendas QVC.
B. I. DO GRUPO KYAIA
Sede Penselo, Guimarães
Fábricas Guimarães e Paredes de Coura
Volume de negócios consolidado 65 milhões de euros
Portefólio Mais de 20 empresas
Marcas Fly London, com vendas de 35 milhões de euros e sete lojas próprias, Softinos, com vendas de 6,2 milhões de euros, e Foreva, com uma rede de 65 sapatarias
Investimentos Em média, 1,5 milhões de euros por ano
Trabalhadores 620
Produção 4500 pares de sapatos por dia
Este artigo é parte integrante da Exame de Junho de 2017