Prever o futuro nem sempre dá bons resultados. A 21 de fevereiro de 1782, Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat, mais conhecido por ser o marquês de Condorcet, tornou-se membro da Academia Francesa pelo seus méritos enquanto pensador e matemático. “A verdade venceu; o espírito humano está salvo! Cada século acrescentará novas luzes às do século anterior; (…) o espírito humano parece engrandecer, os seus limites retrocedem. (…) Qualquer descoberta nas ciências é um favor à humanidade”, afirmou o aristocrata que, nessa sessão, manifestou uma fé inabalável no progresso, na liberdade e na felicidade humanas, tendo até invocado “o grande exemplo” da “soberana de Portugal” – D. Maria I – que ordenara o fim da escravatura nos seus domínios (algo que não correspondia à verdade porque essa suposta abolição só se aplicava na metrópole).
Quem hoje oiça ou leia Elon Musk, um dos homens mais ricos e poderosos do mundo, pode compará-lo a Condorcet. O patrão da SpaceX, do Twitter e da Tesla considera que o filósofo francês é um percursor do transhumanismo, uma ideologia que tem por objetivo libertar a espécie humana dos seus constrangimentos biológicos. Como escreveu há dias Anjana Ahuja no Financial Times, “quem é muito rico ou muito esperto, ou ambos, costuma acreditar em coisas estranhas” . O empresário nascido há 51 anos em Pretória, na África do Sul, comporta-se como um messias que nos pretende catequizar sobre quase tudo – das vantagens da locomoção elétrica, das viagens a Marte ou de que já dispomos de todos os meios para nos tornarmos mais fortes, inteligentes e longevos. Musk, como habitualmente sucede aos gurus, tem demasiadas certezas e poucas ou nenhumas dúvidas.
É um profissional da sociedade do espetáculo que se arroga o direito de nos ditar o destino e que, em nome dos seus interesses pessoais, confunde, de forma endémica e sistemática, realidade e ficção. Exagero?