“Sempre que pensamos em ter um filho só estamos preparados para que ele seja saudável. Quando vi o meu filho e percebi que ele era diferente, senti que tinha um dever maior para com ele.” As palavras de Nuno Neto, 55 anos, revelam a origem da sua motivação para criar a APEXA Associação de Apoio à Pessoa Excecional do Algarve, já lá vão treze anos. Esta entrada de alma e (muito) coração no universo da solidariedade social valeu-lhe, agora, o título de Herói do Ano, no âmbito do prémio Os Nossos Heróis, promovido pela VISÃO Solidária e pela Associação Mutualista Montepio. O anúncio foi feito na sexta-feira, 9, no Teatro da Trindade, em Lisboa, antes dos concertos solidários da fadista Fábia Rebordão e dos Deolinda (que, com os donativos dos espectadores, ajudaram a angariar uma tonelada de alimentos para a Comunidade Vida e Paz).
Nuno Neto não subiu ao palco para receber a ovação do público que encheu o teatro. A essa hora, estava numa ação de angariação de fundos para a APEXA.Timidamente, revela que a notícia o apanhou de surpresa, e atribui o mérito do prémio ao trabalho desenvolvido pela associação. “Heróis são todos aqueles que acreditam no projeto”, enfatiza.
A APEXA nasceu do desespero de um pai que, quando olhava para Tito, o filho mais novo, questionava-se sobre o que seria dele quando deixasse o ensino obrigatório, aos 18 anos, tendo em conta os diagnósticos de espinha bífida e hidrocefalia. “Senti que não havia respostas no Algarve para os jovens com deficiência e quis criar uma tábua de salvação que lhes trouxesse oportunidades de vida.” Hoje, Tito tem 25 anos e, claro, é um dos utentes da instituição. As aulas de acordeão são o seu mais recente motivo de entusiasmo.
Afinal, foi para “o ver a fazer coisas que o façam feliz” que o pai criou a APEXA. Pelo caminho, a associação apoia, anualmente, 300 pessoas.
Tirar coelhos da cartola
“Fazer” é o verbo favorito de Nuno Neto, que se divide entre a presidência da associação e a sua empresa de construção civil. A capacidade de contornar problemas impressiona o filho mais velho, Nuno Miguel Neto, 30 anos, que arriscou candidatá-lo a Herói do Ano. “Quando surge uma situação difícil, ele é capaz de tirar coelhos da cartola para a resolver”, brinca. “O meu pai é de origem humilde, não foi além do 9º ano, mas isso nunca o fez sentir-se incapaz de fazer alguma coisa com significado”. Um significado que o próprio Nuno Neto tem dificuldade em compreender. “Às vezes, nem percebemos como o bem que fazemos é tão precioso.” A humildade não lhe diminui a ambição.
O empresário sonha construir um centro residencial especialmente pensado para pessoas com deficiência, que lhes garanta todos os cuidados. O filho mais velho, formado em arquitetura e atualmente responsável pelas relações externas da associação, daria uma ajuda fundamental ao projeto.
A APEXA é uma organização ambiciosa desde a primeira hora. Nuno Neto sempre quis dar-lhe uma dimensão regional e não apenas local. Sediada em Albufeira, estende-se a Silves e Loulé. Os programas de apoio vão das consultas de psicologia ao desporto adaptado, passando pela estimulação através da arte.
A Intervenção Precoce acompanha 30 crianças com necessidades especiais dos 0 aos 6 anos, o Gabinete de Intervenção Social ajuda famílias em risco de exclusão social e a Integração Socioprofissional apoia os jovens na transição para a vida ativa. Em seis anos, a associação conseguiu garantir trinta estágios para os seus utentes. Neste momento, acompanham 12 jovens a nível socioprofissional. “Se eu disser que eles fazem um estágio de seis meses a custo zero, as empresas aceitam, mas se falar em remuneração é mais difícil”, lamenta. Por isso, Nuno Neto gostava que a própria APEXA tivesse a capacidade de criar oportunidades de emprego, por exemplo, tendo um restaurante próprio, uma empresa de artes gráficas ou até uma banda filarmónica.
Apesar de focada nos jovens com necessidades especiais, a instituição criou o Pescador de Sonhos para resgatar alunos (com ou sem deficiência) em risco de abandono escolar. Atualmente, seguem 150 estudantes.
A fisioterapeuta Ana Santinhos, 31 anos, faz parte da dúzia de técnicos da associação, e admira a capacidade de ouvir do presidente: “Valoriza sempre a opinião da equipa.” A exceção, conta Nuno Miguel Neto, é quando o pai domina os problemas. “Se houver uma fechadura avariada na APEXA, ele não espera por ninguém, vai arranjá-la.” Ana Santinhos não tem dificuldade em vê-lo como um herói: “Tem feito tudo para manter a associação a funcionar, apesar das dificuldades financeiras.” “Os heróis não precisam de superpoderes”, lembra Nuno Miguel. “Basta a vontade de fazer acontecer”. E, para Nuno Neto, não há sonho que não possa ser realidade.