A família de Carlos Eduardo não se conforma com a morte do brasileiro, de apenas 28 anos, há uma semana, no incêndio de Albergaria-a-Velha. À VISÃO, Juliana Martins Fonseca, a namorada do homem conhecido como “Chantilly Papai”, admite que continua a ter “muitas dúvidas sobre o que aconteceu” naquele dia.
“Compreendo que havia caos e pânico, mas também sei que ele estava acompanhado por pessoas mais experientes em situações daquelas. Não quero culpar ninguém… Mas não posso deixar de me questionar porque é que o deixaram arriscar? Se era um grupo, porque é que o deixaram para trás? Porque é que ninguém o ajudou?”, questiona.
Carlos Eduardo partilhava casa, há pouco tempo, com Juliana Martins Fonseca, na localidade de Mourisca do Vouga, no município de Águeda, a poucos quilómetros de onde acabaria por perder a vida. Há três meses tinha começado a trabalhar na empresa Bioflorestal, com sede em Alcácer do Sal. A portuguesa, de 39 anos, conta como ambos planeavam “refazer a vida juntos”. “O Carlos estava muito feliz, estava tudo a endireitar-se. Agora, já não será possível…”, lamenta.
Logo ao início da manhã de segunda-feira, dia 16, Carlos Eduardo integrava um grupo de trabalhadores que se deslocou a uma zona florestal, com vista a recuperar alguma maquinaria que se encontrava numa zona afetada pelo incêndio. “Por volta das 07h20, ele enviou-me alguns vídeos com o fogo já próximo das máquinas. Fiquei muito preocupada”, confessa Juliana Martins Fonseca
As horas passaram sem novidades, até que, ao início da tarde, um colega do namorado telefonou-lhe para informar que “alguma coisa não tinha corrido bem”. A meio da tarde, a Polícia Judiciária deslocou-se à sua residência para informá-la que Carlos Eduardo tinha morrido no fogo. “A empresa só me contactou ao final da tarde, por volta das 18h00”, acrescenta.
“É tudo muito pouco claro. O que me disseram é que o Carlos entrou em pânico, que correu para uma carrinha, enquanto os colegas correram para o outro lado. Andaram lá aos círculos, dentro dos carros, mas nunca mais viram o Carlos”, relata.
PJ investiga o que aconteceu
A PJ assumiu, entretanto, a investigação desta ocorrência. A VISÃO apurou que, neste momento, há versões contraditórias, sobre o número de trabalhadores e veículos da empresa envolvidos nesta situação. Juliana Martins Fonseca apela “a que se saiba toda a verdade sobre o que aconteceu”. “O Carlos merece que seja tudo esclarecido…”, diz.
O que se sabe, para já, é isto: Carlos Eduardo foi encontrado, sem vida, por volta das 15h30 daquele dia, na zona florestal do Sobreiro, no concelho de Albergaria-a-Velha. O seu corpo estava parcialmente carbonizado, mas reconhecível, sabe a VISÃO. A autópsia foi realizada no Instituto Nacional de Medicina Legal. As cerimónias fúnebres decorreram no passado sábado. Carlos Eduardo foi cremado e as suas cinzas ficaram a cargo de uma das irmãs. Os restos mortais de Carlos devem agora ser transportados para a sua terra-natal.
Carlos Eduardo nasceu na favela do Coque, na periferia pobre de Recife, no Nordeste brasileiro. Era o mais novo de 16 irmãos. O brasileiro vivia em Portugal há cinco anos, para onde imigrou à procura de uma vida melhor. Fixou-se na região de Aveiro. Era pai de uma filha pequena, com apenas um ano, que vive com a família da mãe, em Arouca.
Nas redes sociais, era uma figura popular, conhecido pela alcunha de “Chantilly Papai” – que conquistou por atirar chantily a pessoas em festas –, seguido por milhares de internautas. A paixão pelo samba tornou-o figura conhecida do Carnaval de Ovar. No Instagram, publicava fotos e vídeos de festas, viagens ou a vender bolas de Berlim, na Praia da Barra. Tinha ainda um canal de Youtube. Sonhava ser músico e bailarino. O seu maior sucesso (“Chantilly Papai na dança do Egito”) integra a playlist da Rádio Regional de Arouca.
Nos incêndios da última semana, arderam mais de 124 mil hectares em Portugal continental. Os fogos provocaram sete mortos e mais de 170 feridos, números que devolvem à memória a tragédia de Pedrogão Grande, em 2017. Além de Carlos Eduardo, também os bombeiros João Silva (da corporação de São Mamede de Infesta) e Paulo Santos, Susana Carvalho e Sónia Melo (de Vila Nova de Oliveirinha, Tábua) perderam a vida.