Fernando Furtuoso de Melo começou a audição na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com uma declaração na qual assegurou que “não houve qualquer tratamento de favor por parte da Presidência da República” no caso das gémeas luso-brasileiras que acederam em Santa Maria a um dos tratamentos mais caros do mundo, depois de um pedido feito pelo filho do Presidente da República. Ficou, contudo, evidente o desconforto do chefe da Casa Civil de Belém com a intervenção de Nuno Rebelo de Sousa no caso.
Nome de Nuno Rebelo de Sousa foi omitido no mail para o Governo
Furtuoso de Melo admitiu ser “óbvio” que há “algum desconforto” em situações em que há um envolvimento de um familiar direto do Presidente, explicando que foi por isso que deliberadamente não reencaminhou o e-mail original de Nuno Rebelo de Sousa para o chefe de gabinete do primeiro-ministro, limitando-se a reproduzir o seu conteúdo, para que não constasse aí o remetente. “Eu acho que fiz o que tinha de fazer, o mais correto”, disse.
O chefe da Casa Civil do Presidente foi explicando que, desde que o Presidente assumiu funções, já recebeu cerca de 190 comunicações com todo o tipo de pedidos de ajuda e intervenção da Presidência, o que daria uma média de 80 pedidos por dia.
A tese de Fernando Furtuoso de Melo é a de que o tratamento dado a este pedido de Nuno Rebelo de Sousa foi exatamente o mesmo que é dado a todos os outros pedidos, dando diversos exemplos disso, incluindo o de um cidadão que por diversas vezes foi até ao Palácio de Belém ameaçar com uma greve de fome por não conseguir uma consulta.
“Não é filho do Presidente da República. Que eu saiba! Que é muito insistente, é. Tem uma página do Facebook muito curiosa, com imensas imagens do Presidente da República”, disse depois de questionado pelo deputado do CDS João Almeida sobre se se tratava também de um familiar do Presidente.
Os outros pedidos de Nuno
“Não posso, face à lei, arquivar o pedido de um cidadão”, foi insistindo Furtuoso de Melo, explicando estar a seguir o que é disposto no Código de Procedimento Administrativo, segundo o qual os cidadãos têm o direito de petição face à Administração. Acontece que no CPA também se diz que os titulares de cargos públicos estão impedidos de tramitar os processos quando os peticionários são seus familiares em linha direta.
Apesar disso, Furtuoso de Melo admitiu que este não era o primeiro pedido feito por Nuno Rebelo de Sousa à Presidência, revelando que houve pelo menos três pedidos feitos pelo então presidente da Câmara do Comércio Luso-Brasileira de Comércio para que Marcelo Rebelo de Sousa estivesse com comitivas de empresários brasileiros que vieram à Web Summit, pedidos esses que foram satisfeitos, tal como terão sido outros idênticos vindos de outras câmaras de comércio.
Confrontado com um mail no qual Nuno Rebelo de Sousa pedia “uma ajuda maior” para lidar com o caso, queixando-se da “burocracia portuguesa”, Fernando Frutuoso de Melo deixou subentendida a ideia de que o filho do Presidente pretendeu uma cunha e que essa expectativa foi gorada.
“O Dr. Nuno Rebelo de Sousa não teve a resposta que esperava”, disse recusando-se, apesar da insistência do deputado João Almeida, a ser claro na explicação do que entendia ser a expectativa do filho de Marcelo. “Todos percebemos o que quer dizer”, limitou-se a observar.
A garantia sobre a intervenção de Marcelo
Furutoso de Melo garantiu que não teve qualquer outro contacto sobre este caso com Nuno Rebelo de Sousa nem com a companheira deste, Juliana Drummond, além do que consta nos e-mails que estão em poder da CPI, e também assegurou não ter tido nenhum contacto sobre este assunto com a então ministra da Saúde Marta Temido.
Mais: diz nunca ter recebido de Marcelo Rebelo de Sousa qualquer pedido para lhe dar conhecimento sobre o andamento deste processo. Ou seja, segundo o chefe da sua Casa Civil, a única intervenção de Rebelo de Sousa em todo este processo terá sido a de reencaminhar do seu mail pessoal para a Presidência o pedido recebido pelo mail pessoal do filho.