Acusado de corrupção passiva, branqueamento de capitais e fraude fiscal para favorecer os interesses do Grupo Espírito Santo (GES), num processo separado do chamado caso EDP, o antigo ministro da Economia Manuel Pinho vai chamar a tribunal políticos, empresários e banqueiros, de forma a tentar demonstrar durante a fase de instrução não ter cometido os crimes que o Ministério lhe imputa. A lista de testemunhas arroladas pela defesa para a fase de instrução inclui os antigos primeiros-ministros Durão Barroso, Pedro Santana Lopes e José Sócrates, os banqueiros Jorge Jardim Gonçalves e António Domingues, o ex-ministro do Ambiente Francisco Nunes Correia, o antigo secretário de Estado Bernardo Trindade, os empresários Carlos Monjardino e Vasco de Mello e o antigo presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), Vítor Santos. Basílio Horta, presidente da Câmara de Sintra, também está entre as testemunhas arroladas.
Segundo o Requerimento de Abertura de Instrução (RAI), a que a Visão teve acesso, Manuel Pinho “assume que recebeu quantias do GES que não declarou fiscalmente, com a consequência de não pagar sobre tais montantes os impostos devidos”. “Não vale a pena ‘dourar a pílula’”, refere o seu advogado, Ricardo Sá Fernandes, para quem “o arguido cometeu, ao longo de vários anos, crimes de fraude fiscal, tendo ‘embarcado’ num esquema global dentro do GES, em que os pagamentos de parte das remunerações e de prémios eram feitos ‘por fora’”.
Isto não quer dizer, na opinião da defesa, que Manuel Pinho tenha sido corrompido por Ricardo Salgado, tal como sustenta a acusação, para favorecer os interesses do Grupo Espírito Santo. Sá Fernandes refere que o alegado pacto corruptivo “nunca existiu” e que “algumas das imputações não só não são verdadeiras, como são completamente inverosímeis e até delirantes”, dando como exemplo o facto de a acusação situar o início da ligação corruptiva entre Pinho e Salgado em maio de 2004.
“Se recordarmos o que era então a vida política portuguesa em maio de 2004, primeiro-ministro Durão Barroso, presidente do PSD, cujo Governo dispunha de uma sólida maioria parlamentar. Em junho de 2004, Durão Barroso demitiu-se do seu cargo e foi presidir à Comissão Europeia, tendo então sido empossado como primeiro-ministro Santana Lopes, à frente de um Governo também apoiado pela mesma maioria parlamentar. Não se perspetivava que o PS voltasse ao governo tão rapidamente”, lê-se no documento
Quanto aos 15 mil euros mensais que o antigo ministro foi recebendo enquanto ocupou o cargo no primeiro governo de José Sócrates, a defesa alega que Manuel Pinho abdicou, quando entrou para o governo, abdicou das “condições extremamente vantajosas”, tendo, no entanto, direito a um prémio de participação nos resultados do BES de 2004 e do primeiro trimestre de 2005, que o antigo ministro e Ricardo Salgado entenderam definir em 1,5 milhões de euros, o qual seria pago, na versão apresentada no RAI, a explicar as transferências mensais para uma conta offshore.
“Foi acordado que a quantia de 500.000 euros seria imediatamente disponibilizada, ficando o restante para saldar mais tarde. Não foi previsto que aquilo que faltava era para ser pago em prestações mensais de cerca de 15.000 euros (como terá vindo a acontecer), o que não foi pedido nem desejado pelo arguido, que disso não foi oportunamente informado e do que só teve consciência muito mais tarde”, refere o documento, salientando que Pinho, ao entrar para o governo, prescindiu de uma remuneração anual de 360 mil euros.
No RAI apresentado no Tribunal Central de Instrução Criminal de Lisboa, onde decorrerá a fase de instrução, o antigo ministro da Defesa coloca ainda em causa uma apreensão de correio eletrónico determinada pelo juiz Carlos Alexandre, na qual se incluiria correspondência trocada com os seus advogados. Manuel Pinho volta ainda a contestar a sua primeira constituição como arguido no processo, em que não foi confrontado com os factos, nem interrogado como arguido.