O projeto, que está agora a dar os primeiros passos, será apresentado na quarta-feira no encontro nacional de ciência e tecnologia, Ciência 2021, e resulta de uma parceria entre o Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) e o Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier (ITQB) da Universidade Nova de Lisboa.
Se a sua eficácia se comprovar, esta será uma vacina contra o SARS-CoV-2 muito diferente daquelas que estão atualmente disponíveis, já que se trata de uma vacina oral que usa bactérias para induzir anticorpos.
“No fundo, o que é a vacina? É uma bactéria recombinante, ou seja, geneticamente alterada, para expressar à sua superfície um pedacinho da proteína da espícula do coronavírus”, a proteína Spike, explicou à agência Lusa uma das investigadoras responsáveis, Isabel Gordo.
Essa bactéria é introduzida por via oral como probiótico, “como se fosse um iogurte”, e é quando chega ao intestino que o seu trabalho começa: “Dentro do intestino, o sistema imunitário vê o que a bactéria está a mostrar, esse pedacinho da espícula do coronavírus, e produz anticorpos”, continua a investigadora do IGC.
Os primeiros passos deste estudo já começaram a ser dados e os resultados preliminares são positivos, revelando que a potencial vacina foi capaz de produzir anticorpos contra o novo coronavírus, conforme esperado.
“Foi esse o passo de demonstração de que o princípio está a funcionar. O que temos de saber a seguir é se, depois de darmos o tal iogurte aos ratinhos, quando os infetarmos não ficam doentes”, explicou Isabel Gordo.
Apesar de, para já, a potencial vacina estar a ser testada apenas em ratinhos, os animais foram geneticamente modificados para terem o recetor do SARS-CoV-2 humano, ou seja, para que quando infetados apresentem os mesmos sintomas que os humanos.
A ideia de uma vacina oral com recurso a bactérias não é nova e foi no conhecimento e resultados já adquiridos por eles próprios e por colegas que os investigadores responsáveis se apoiaram para partir para este projeto.
Além do estudo das bactérias e do potencial de algumas para induzirem a produção de anticorpos contra determinadas doenças, o projeto assenta também em vários anos de estudos no ITQB sobre os esporos bacterianos, estruturas celulares metabolicamente adormecidas e capazes de resistir a condições ambientais extremas.
Outro dos investigadores, Adriano Henriques, explica, citado em comunicado, que para esta vacina era essencial garantir que a bactéria administrada conseguia sobreviver nessas condições extremas, de forma a chegar intacta aos intestinos, e que essa resistência representa também uma vantagem para o armazenamento e transporte da vacina.
Partindo desse conhecimento consolidado, Isabel Gordo sublinha, ainda assim, que se esta vacina funcionar será “completamente diferente”, mais fácil de produzir, distribuir e administrar, além da facilidade em modificar a estrutura da proteína introduzida, “uma vantagem quando temos mutações do vírus a emergir e é preciso ajustar as vacinas”.
Na próxima fase do projeto, os investigadores vão testar a capacidade da vacina em ambiente laboratorial protegido e para isso o IGC construiu um laboratório de Biossegurança de nível 3, que resulta de um “reforço estratégico das instalações para alargar a investigação a outros estudos com vírus e bactérias ativos”, segundo explica o instituto em comunicado.
MYCA // JMR