Pedro Batista, 20 anos, sempre soube que o seu caminho passaria pela Economia. Desde que conseguiu entrar na Universidade Católica, em Lisboa, há três anos, ganhou outra certeza: ir estudar para fora, ainda antes de escolher o mestrado. Nada nem ninguém se teria oposto aos seus planos, exceto uma pandemia que atinge todos os países do mundo, em especial Itália, para onde se candidatou, em fevereiro.
Quando soube que tinha sido aceite, em maio, na Luigi Bocconi, em Milão, já a situação da Covid-19 evoluíra muito. Desde então, pôs-se a monitorizar a cidade italiana e as notícias nunca foram boas. Em junho, deram-lhe a hipótese de desistir da candidatura ou de ficar a fazer o programa de intercâmbio online. Não ofereceram como cenário a mudança para o segundo semestre. A meia dúzia de colegas portugueses com que iria fazer Erasmus em Milão optou por ficar em terra. “Nunca pensei em desistir”, conta.
Pedro fez visitas guiadas virtuais a Milão, participou num show cooking e tomou um aperitivo ao final da tarde, bem ao jeito italiano
No entanto, não se sente sozinho. Como ele, há mais 200 estudantes estrangeiros, de todas as nacionalidades, nesta universidade italiana, com os quais se encontra frequentemente online. Há alunos na China a assistirem a aulas às duas da manhã e brasileiros no outro hemisfério. “No início do semestre, esforçaram-se imenso para nos integrarem”, lembra. Nessa altura, Pedro fez visitas guiadas virtuais a Milão, participou num show cooking, para aprender a fazer uma verdadeira carbonara, e tomou um aperitivo ao final da tarde, bem ao jeito italiano.
O horário escolar não é intenso: três aulas por dia. No final do semestre, terá de fazer exames às cadeiras escolhidas e, pelo caminho, há vários trabalhos de grupo, produzidos à distância. A parte letiva acaba em dezembro, mas o programa terminará em fevereiro.
Para já, este estudante não se arrepende nem um pouco da decisão tomada e acha que ainda vai ser valorizado por isso. No entanto, a real experiência no estrangeiro terá de ficar adiada para a altura do mestrado, assim a pandemia o permita. Pedro despede-se agora, pois tem uma aula de Economia para assistir e, mais logo, um quiz virtual com os colegas.
Só por um mês
Rita Coelho, 24 anos, teve direito a todas as festas de receção e já ia bem lançada na integração quando a pandemia a recambiou para casa dos pais, no Porto, em março. A estudante de Gestão Hoteleira contava regressar a Praga, na República Checa, semanas depois, mas a história não se conta bem assim. Aliás, a sua experiência de Erasmus – “espetacular” – durou apenas um mês. E acabou por desistir dela, quando a faculdade de lá mandou os estudantes ficarem nos países de origem.
Só que Rita não se esqueceu facilmente da experiência, ainda que fugaz. E em maio já estava outra vez a candidatar-se para Zagrebe e a ser aceite para integrar a universidade da Croácia, no início do ano letivo 2020/2021, em setembro. As malas não chegaram a ser feitas nem os voos marcados ou a casa procurada. Próximo da partida, Rita começou a pensar no que tinha passado com a sua vinda abrupta, o dinheiro gasto em vão na residência, no passe, em alimentação… “Apesar de ter sido um dos melhores meses da minha vida, não podia arriscar a que voltasse a acontecer tudo novamente”, afirma, numa sala da Universidade Europeia, em Lisboa, onde se senta agora para as suas aulas.
Se está resignada? Nem por isso, pois sonha com o dia em que poderá regressar à cidade onde viveu durante um mês.
A gozar como podem
A imagem do computador mostra João Casimiro, 20 anos, e Joana Oliveira, da mesma idade, sentados num sofá junto a uma parede decorada com mapas. Os namorados estão nesta casa, em Sófia, na Bulgária, desde setembro, ao abrigo de uma bolsa Erasmus. No entanto, logo no início da conversa, assumem que não estão ali por “questões académicas”, embora ambos frequentem o 3º ano de Management, no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG).
Quando se candidataram, no final de 2019, e foram aceites, em fevereiro de 2020, a Europa ainda estava a salvo do coronavírus, por isso a notícia foi recebida em celebração. E nem o que se passou nos meses seguintes os demoveu da ideia. “O nosso único receio é não conseguir voo para ir passar o Natal a casa”, conta João, a pensar na família que deixou na Madeira.
Quando chegaram a Sófia ainda encontraram tudo aberto, bares, restaurantes e festas para estudantes Erasmus. No início, as aulas eram todas presenciais, com não mais do que 15 alunos, mas agora já passaram para online. Nada que incomode este jovem casal – assim os dois não perdem 20 minutos a ir de transportes e outros tantos a voltar, têm mais liberdade para passear pelas redondezas, correr, fazer exercício nos parques… Despedem-se. Há encontro marcado num bar ao ar livre, que o tempo ainda não arrefeceu a ponto de não se aguentar estar na esplanada.
Em Coimbra, sem festa
Se João e Joana estão felizes em Sófia, Anisha Bakhai, 21 anos, não lhes fica atrás. Esta estudante de Literatura Moderna trocou Londres por Coimbra, em finais de agosto, e por enquanto não se arrependeu. Claro que já lhe contaram como era a cidade e a vida estudantil antes de haver uma pandemia, mas, no início, ainda pôde aproveitar alguma coisinha.
Fez um roteiro por restaurantes e bares, por exemplo, e experimentou Stand Up Paddle, no rio Mondego, que avista da janela do seu quarto. Com os amigos estrangeiros (estão à volta de 300 estudantes internacionais, de todas as nacionalidades, nesta cidade), faz caminhadas, nada, pratica surf, janta fora, joga badmínton, passeia pelo Norte do País. E, claro, comemorou em festas, aquelas que já não se fazem porque foram responsáveis por alguns surtos entre estudantes universitários.
Na verdade, se o mundo continuasse igual, teria feito um semestre em Portugal e outro em São Paulo, no Brasil. Esta segunda parte, por conselho familiar, saiu dos planos, e Anisha vai ficar até ao final do ano letivo em Coimbra, na casa que partilha com três raparigas portuguesas. “Não podia suspender a minha vida”, garante, satisfeita por ter arriscado. “Em casa, não poderia voltar para a universidade, está tudo em modo online. Aqui tenho mais liberdade e outras oportunidades.”
Ao telefone, a inglesa esforça-se por atravessar algumas palavras em português no seu discurso, que naturalmente lhe sai na língua-mãe. “Toda a gente me diz que devia ter vindo no ano passado, mas tento tirar o melhor da situação. Só gostava de ver a cara dos meus colegas. Se os vir na rua, não os reconheço.”