Uma empresa canadiana, a Receptiviti, tem uma ideia para se descobrir quão satisfeitos e felizes estão os funcionários das empresas. Não, não envolve inquéritos nem reuniões com os trabalhadores, mas a sugestão é que se analisem as mensagens ou emails trocados âmbito profissional, mesmo de voz ou até em aplicações como o Slack, que facilitam a comunicação entre eles.
Apesar de o método adotado por esta empresa, sediada em Toronto, utilizar o processamento de linguagem natural, área da ciência da computação, inteligência artificial e da linguística que estuda os problemas da geração e compreensão automática de línguas humanas, a empresa não se foca nisso, mas sim num ramo da linguística que sugere que são as partes passivas da fala, como os pronomes e proposições, que se usam sem pensar, que dão sinais sobre a felicidade dos trabalhadores. No fundo, analisa-se a forma como as pessoas comunicam e não tanto o que dizem.
A ciência por detrás da abordagem desta empresa não é nova, mas aplicá-la aos trabalhadores e à forma como eles se sentem é um grande desenvolvimento. Claro que a ideia de existir um serviço externo que tem acesso aos emails e mensagens trocados entre os trabalhadores não é muito bem-vinda e parece uma forma muito invasiva de controlar o que fazem, podendo ser vista como um ataque à privacidade, mesmo em contexto profissional.
Mas, de acordo com um dos fundadores e CEO da Receptiviti, Jonathan Kreindler, esta empresa só trabalha com aquelas que têm o consentimento de todos os seus funcionários para aceder às suas comunicações profissionais. Além disso, assegura, não se analisam os dados de forma individual. Por outro lado, têm-se em conta as equipas e departamentos das empresas e determinadas caraterísticas como o género, por exemplo. A partir daí, podem retirar-se algumas conclusões importantes, como o facto de as mulheres do departamento financeiro de uma empresa serem menos felizes do que os homens do mesmo departamento, assim explica o CEO à Quartz.
O modo de funcionamento deste método foi explicado num evento do Tedx, em 2013, por um dos fundadores da empresa. James W. Pennebaker, que também é psicólogo na Universidade do Texas, em Austin, explicou que menos de metade das palavras que se usam quando se fala ou escreve querem consciente e ativamente transmitir um significado específico. Mas a maioria delas, que é utilizada quase de forma inconsciente, pode ter significados mais subtis, não percetíveis por qualquer um.
Pennebaker percebeu, ao analisar documentos escritos de pessoas que sofreram traumas, que os pronomes usados durante a fala ou a escrita podem conter dicas silenciosas sobre o seu estado emocional. E dá um exemplo: pessoas menos felizes têm tendência a usar mais pronomes pessoais na primeira pessoa, como o eu, do que a média e, pelo contrário, utilizam menos pronomes pessoais na terceira pessoa.
Ao longo do seu estudo, o psicólogo percebeu que os estados mentais das pessoas analisadas refletiram-se bastante no uso de preposições (para, o), pronomes (eu, ele) e verbos auxiliares. De acordo com Pennebaker, essas palavras de apoio são “profundamente sociais” e analisá-las pode revelar a forma como uma pessoa se sente e como se relaciona com o mundo. Além da questão dos pronomes na primeira ou terceira pessoa, os indivíduos analisados também tendiam a falar mais sobre o presente do que sobre o futuro. O fundador da empresa testou a técnica em vários tipos de comunicação e deu conta, também, de que, quando várias pessoas de um grupo ou empresa têm uma boa relação, começam a refletir a linguagem umas das outras.
Já existem outras ferramentas que têm o objetivo de testar o estado emocional dos trabalhadores e algumas que permitem até perceber se estão prestes a ter um burnout, por exemplo. Contudo, é importante que as empresas forneçam aos funcionários todo o conhecimento acerca dessas novas ferramentas, para se garantir que não há qualquer sentimento de invasão de privacidade.
As estratégias mais tradicionais adotadas pelas empresas atualmente têm algumas limitações, como o facto de os funcionários terem de perder tempo a preencher inquéritos ou até poderem não ser completamente honestos quanto à sua satisfação no trabalho, por exemplo.