Com o bisavô e o avô nascidos e criados em Oliveira do Hospital, desde outubro passado que Paulo Costa, 35 anos, anda num vaivém, entre a Sobreda, na Margem Sul de Lisboa, e Oliveira do Hospital. As viagens fazem-se para entregar às pessoas que perderam os seus animais nos incêndios novos exemplares de várias espécies. Há cinco meses que este vendedor de peixe no mercado da Sobreda anda a angariar dinheiro, através da venda de rifas, 300 blocos de cem rifas distribuídas até na comunidade portuguesa imigrante, da qual resultarão um total de 30 mil euros. Em novembro passado entregou os primeiros 80 animais. Desta vez, no passado domingo, 11, na Festa do Queijo, em Oliveira do Hospital, entregou 12 cabras murcianas, 2 burros mirandeses, 50 patos, 100 galinhas e 60 pintos. Num site de venda de usados, Paulo Costa procurou “animais de quinta” e lá conseguiu quem entregasse os animais na feira. Pagou €6 por cada galinha adulta e poedeira, €80 por cabra, mais de €100 por cada ovelha bordaleira e €500 cada burro mirandês, e “bem negociado”.
Com a ajuda das juntas de freguesias, Paulo Costa conseguiu chegar à lista de pessoas registadas que ficaram sem os seus animais. “É impossível repor a quantidade perdida”, diz, mas sente-se orgulhoso por ter conseguido ajudar cerca de 50 pessoas que tinham perdido uma fonte de subsistência, para muitos a única.
A Feira do Queijo, que contou com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, é um dos principais locais de divulgação e venda do queijo Serra da Estrela com certificação DOP (Denominação de Origem Protegida). Em outubro, com a morte de mais de oito mil animais, na sua maioria bordaleiras, nos 18 concelhos da Região Demarcada do queijo da Serra da Estrela, houve uma quebra de um terço na produção leiteira. Já antes da catástrofe dos incêndios, a ANCOSE – Associação Nacional de Criadores de Ovinos da Serra da Estrela tinha projetado um Centro de Recria, em Oliveira do Hospital, na tentativa de proteger as raças autóctones (churra mondegueira e bordaleira) e de repovoar a região com animais. Nos últimos quatro a cinco anos, com cada vez menos pessoas dedicadas ao pastoreio, houve uma diminuição do número de animais, passando de 120 mil para 80 mil. Os incêndios só vieram acelerar o processo, e com o apoio financeiro, principalmente, do grupo Jerónimo Martins, que doou cerca de 50 mil euros, a ANCOSE pôs em prática o plano. Comprou aos produtores locais 400 borregas, entre os 45 e os 60 dias, por €70 cada uma e levou-as para o Centro de Recria onde ficam quatro a cinco meses para serem tratadas, desparasitadas, acompanhadas clinicamente e depois identificadas e dadas aos pastores. A distribuição irá acontecer em abril e as pessoas terão de esperar mais três ou quatro meses até as borregas estarem prontas. “Só em julho, o pastor ‘deita o carneiro às malatas’, expressão da gíria pastorícia, para elas criarem. Em setembro do próximo ano poderão parir pela primeira vez”, explica Manuel Marques, presidente da direção da ANCOSE, que reclama a falta de cinco mil ovelhas bordaleiras para o queijo Serra da Estrela recuperar a sua produção.