Há os Painéis de São Vicente de Fora, do mestre Nuno Gonçalves, pintados entre 1470 e 1480, descobertos no final do século XIX, e expostos no Museu Nacional de Arte Antiga, em Lisboa.
E agora há os Painéis de São Vicente, pensados, elaborados e interpretados pela turma 11º L da Secundária de Cacilhas-Tejo, premiados em maio, e prestes a serem expostos no átrio daquela escola.
Os originais são uma obra composta por seis painéis (Frades, Pescadores, Infante, Arcebispos, Cavaleiros, Relíquia). Diz tratar-se de um auto-retrato de toda a sociedade, da nobreza, do clero e do povo. A única figura que, imediatamente, se identifica é a do Infante D. Henrique.
A versão de 2016 é igualmente composta por seis painéis (Desporto, Política e Religião, Música, Hollywood, Personagens e Mortos). Dizem tratar-se de uma Selfie das Celebridades – numa evocação à célebre fotografia de Ellen DeGeneres na cerimónia dos Oscares de 2015 – retratando todos os setores da sociedade. A figura central, que segura o selfiestick, é Leonardo Di Caprio, o ator que venceu o Oscar de 2016, pela sua interpretação em The Revenant.
Enquanto o original descoberto no Paço Patriarcal de São Vicente de Fora, em Lisboa, foi feito a óleo e têmpera sobre madeira, o que a turma de Cacilhas idealizou concretizou-se em seis fotografias.
Além dos 17 alunos do curso profissional de técnico de design gráfico que participaram neste projeto vencedor, houve duas professoras por trás da ideia e da sua concretização – Paula Penha, de Oficina Gráfica, e Teresa Santana, de História e Cultura das Artes.
“A turma foi dividida em grupos, consoante os painéis. Depois houve que escolher quem entraria e como seriam caracterizados os modelos. Tivemos duas semanas para conseguir acabar o nosso quadro”, conta Paula Penha. Antes, já os alunos tinham ido ao Museu de Arte antiga, numa visita guiada para ficarem a saber tudo sobre os Painéis. Agora que ganharam um livre-trânsito, para eles e a família, que lhes dá entrada em todos os museus e palácios nacionais, poderão revê-los sempre que quiserem.
“Não conseguimos ter tantas personagens como no original, por uma questão de perspetiva, mas tentámos recriar o melhor possível as poses da pintura, com as devidas atualizações”, explica a professora.
Jasmim Cotrim, de 17 anos, entrou em quatro dos seis painéis – foi preciso repetir-se os modelos em alguns casos, muito bem disfarçados pela caracterização, recorrendo sempre a prata da casa. Ela foi uma adepta de futebol no primeiro painel, uma deputada, Bilbo Baggins (Hobbit) e Kurt Cobain.
Apesar de já terem passado alguns meses desde que conceberam esta obra, ainda se ri ao lembrar alguns pormenores, como o dia em que se passearam pela escola disfarçados, a altura em que cortou uma peruca para fazer a barba do Jack Sparrow, quando pintaram uma colega de preto para ser o Snoop Dogg e ainda o tubo de gel gasto na cabeça de um amigo para se parecer o mais possível com a fadista Mariza.
Tiveram algumas dúvidas se haveriam de retratar José Sócrates de gatas, dada a delicadeza do seu processo judicial. Mas não tiveram dificuldades em caracterizar Cristiano Ronaldo (uma bola e um equipamento de Portugal emprestado), nem em meter ali à força a Kim Kardashian, de vestido vermelho bem justo (“está a roubar a cena”, diz Jasmim) ou Jennifer Lawrence a cair, como nos Oscares. E quanto ao Michael Jackson, no painel dos mortos? “Por sorte temos uma colega muito parecida com ele”, conta, divertida, a aluna, feita porta-voz da turma, à força.